Na
entrada principal do intramuros do Solar Monlevade existe uma bela porteira,
larga o suficiente para permitir o trânsito oposto de dois carretões de bois ao
mesmo tempo. Ela é de abertura dupla,
tem o centro abatido e encontra-se instalada entre dois sólidos mourões de
pedra lavrada, originalmente, encimados por um belo par de grandes lanternas,
conforme demonstram as fotos acima.
O
conjunto arquitetônico original do Solar Monlevade é tombado para fins de
preservação pelo inciso IX do art. 170 da Lei Orgânica Municipal. Significa
dizer que qualquer supressão ou modificação em elemento arquitetônico do Solar
Monlevade, inclusive de tudo o que está em seu intramuros, só pode ser feita
mediante a autorização do Conselho Municipal de Patrimônio Cultural, com o fim
de preservação, o que eu acredito que não seja o caso. O Solar Monlevade tem
passado por muitas intervenções ultimamente, que ocorrem totalmente à revelia
do Conselho de Patrimônio Cultural e da Casa de Cultura. Há pouco tempo, a
ArcelorMittal instalou uma grande estrutura em aço dentro do Museu Monlevade,
que também se encontra instalado no intramuros do Solar, alterando o conjunto arquitetônico
tombado. Enviei email para a siderúrgica e para a Prefeitura, requisitando
cópia da autorização do Conselho para a instalação da mencionada estrutura de
aço e não obtive resposta em ambos os casos.
Não
é a primeira vez que a poderosa siderúrgica suprime elemento histórico tombado
do conjunto arquitetônico do Solar Monlevade. Em 2017, a Arcelormital já havia deixado ruir um telhado rústico que existia sobre o engenho hidráulico de pilões que
integrava o acervo do Museu Monlevade. No Relatório de 1853, o próprio
Monlevade mencionou o citado engenho, conforme transcrevo a seguir:
“Um bicame, ou tanque d’água, colocado a 30 palmos
acima do fundo do quintal e no meio da casa está recebendo a água toda do
ribeirão, dando a força motriz para as duas rodas... há também duas mãos de pilões
movidas por uma das rodas, as quais servem para reduzir em pó a pedra de ferro,
quando não se emprega a jacutinga na fundição, assim como para sacar certas
borras ricas de partículas de ferro, as quais lavadas e refundidas dão um ferro
de superior qualidade.”
Sem o telhado e exposto à chuva, a roda d’água do engenho e seu o bicame de madeira se perderam e ruíram. E o que fez a Arcelormittal? Restaurou o bem tombado? Não. Ela apenas o suprimiu, como demonstra a postagem de novembro de 2017.
Agora, foram as lanternas da porteira principal que sumiram. Obviamente, não é papel da Arcelormittal conservar os bens históricos do Município. Também não é papel da Arcelormittal organizar museu, mantê-lo aberto à visitação, nem restaurar os bens que se deterioram por omissão. O papel da siderúrgica é o de produzir aço. Contudo, se é a Arcelormittal que detém a propriedade dos bens históricos, ela deve providenciar a sua preservação, restauração e acesso ou, então, deve entregá-los para o seu verdadeiro dono que é o povo de João Monlevade. Manter os bens históricos fechados e se perdendo, quando não são alterados, é destruir a identidade monlevadense e o potencial turístico de João Monlevade. São, justamente, o Solar Monlevade, o Museu Monlevade e o Parque Histórico da Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros, no Jacuí, que inserem o Município dentro do roteiro turístico da Estrada Real de Forma muito especial, pois ao contrario do discurso deturpado cunhado pela da própria Arcelormittal no sentido de “uma pequena forja catalã, fabriqueta de enxadas”, Monlevade, segundo os documentos históricos, foi a maior e mais importante Fábrica de Ferro a funcionar durante o Império Brasileiro, atuando como fornecedora preferencial de artefatos pesados de ferro para as Minas de Ouro do sec. XIX, alguns deles com mais de uma tonelada de peso, os maiores já forjados nos Brasil até então.
O Museu Monlevade, por exemplo, se bem administrado e aberto
à visitação, tem o potencial de alavancar o turismo local, porque conta com
acervo completo sobre a história da indústria do ferro em Minas Gerais. Mas,
para que isso ocorra é preciso conservar e abrir os bens históricos à visitação,
coisa que a Arcelormittal demonstra não estar apta a fazer, por motivos óbvios. Antes que não sobre nada, é preciso que o Município
tome para si a administração dos bens históricos de João Monlevade, não somente
para preservar a identidade local, mas também para alavancar o turismo. Existem
muitos instrumentos jurídicos para tal. Contudo, a Prefeitura atual nem sabe
onde fica o Parque Histórico do Jacuí. Registre-se, por fim, que foi na prefeitura do PT,
que as lanternas do Solar Monlevade desapareceram.
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