sexta-feira, 30 de abril de 2021

Quebra-mola na Avenida

Insisto. O nível cultural de uma cidade pode ser medido pela quantidade de quebra-molas encontrados em suas ruas. Quanto maior o número deles, menor será o nível cultural daquela localidade. Infelizmente, a administração Laércio/2024 Fabrício/Candidato já instalou seu primeiro quebra-molas (foto) e não foi em qualquer lugar. Ele foi instalado na Avenida Getúlio Vargas, a principal do Município.

Mesmo disfarçados de faixas de pedestres, como é o caso, os quebra-molas aumentam o consumo dos veículos, o que contribui para o acréscimo da emissão de gases estufas e da poluição atmosférica, danificam a suspensão dos mesmos e denunciam uma cultura de desobediência às regras em geral, sobretudo as de segurança, como o limite de velocidade nas vias. No caso de instalado na Getúlio Vargas, que tem sido cenário de enxurradas e inundações sazonais, os famigerados quebra-molas ainda podem produzir o represamento das águas, agravando ainda mais a situação. Sob o ponto de vista ambiental, um quebra-molas na Avenida Getúlio Vargas não faz o menor sentido diante, por exemplo, do princípio de se “pensar globalmente e agir localmente”.  Veja como é ilógico. A administração instalou um quebra-molas que aumenta o consumo dos veículos e, conseqüentemente, a emissão de gases estufa que agravam as mudanças climáticas. E quando a tempestade cair, aquele quebra-molas ainda vai atuar para represar a inundação, potencializando-a.        

Quem utilizou muito os famigerados quebra-molas de forma eleitoreira foi a última administração. Como se vê, nada mudou, apesar de já existirem alternativas eletrônicas para os mesmos.  

quarta-feira, 28 de abril de 2021

Chico: o Rei Preto de Minas Gerais, o primeiro coroado no Brasil


Um país que ignora sua verdadeira história é como uma pessoa que sofre de amnésia. Se por algum motivo perdemos a memória individual, deixamos de ser quem somos, perdemos nossa identidade e tornamo-nos incapazes. Com o país e sua memória coletiva, isto é, a história nacional, não é diferente. No Brasil, há pouquíssima consciência histórica e a história lecionada nos bancos escolares é quase sempre enganosa e muito deturpada. Deturpação muito recorrente sobre a história brasileira é a de que “Portugal apenas enviou degredados para o Brasil”, o que, definitivamente, não é a verdade história. Em 1808, por exemplo, o intrépido Rei Dom João VI, evadindo-se do contexto desfavorável napoleônico, transferiu toda sua corte para o Rio de Janeiro, fato extraordinário sem paralelo no mundo e fundamental, sobretudo, para a unidade territorial brasileira. A partir daí, iniciou-se a única linhagem real das Américas, constituída por figuras importantíssimas para a história brasileira, como Dom Pedro I, Dona Leopoldina da Áustria e Dona Amélia de Leuchtenberg, Dom Pedro II e Dona Teresa Cristina das Duas Sicílias, a Princesa Isabel e até Dona Maria da Glória, a belíssima e desconhecida princesa brasileira, nascida no Palácio São Cristóvão no Rio de Janeiro, que assumiu o trono de Portugal.            

 Então, não é verdade que somos um país fundado por degredados, como nos ensinaram nos bancos escolares. Somo um país de reis e de rainhas, muito deles nascidos aqui. Mas, muito antes de Dom João vir para o Brasil ou de Maria da Glória assumir o trono de Portugal, foi, solenemente, coroado no Brasil um rei, que, apesar de negligenciado pela história adotada como a oficial, foi  tão ou até mais importante quanto os demais para a constituição da identidade brasileira, a ponto de seu reinado ter passado incólume pela proclamação da República, seguindo vigente ainda hoje, quase trezentos anos depois de sua aclamação. Seu nome é Chico Rei.      

Inicialmente, Chico Rei chamava-se Galanga. Ele era sumo-sacerdote do deus Zambi-Apungo e rei de uma sociedade semi-feudal no Reino do Congo, África, quando foi capturado junto de toda sua corte por traficantes de escravos e trazido para o Brasil, desembarcando no porto do Rio de Janeiro. Batizado de Chico, Galanga e muitos de seus súditos foram vendidos no Rio de Janeiro para o minerador Augusto de Andrade Góis e conduzidos para Vila Rica, onde foram empenhados nos trabalhos de mineração nas galerias subterrâneas da famosa Mina de Ouro da Encardideira, que leva este nome curioso em razão da composição um tanto viscosa, colorida de ocre, característica do mineral aurífero de seus veios, o que fazia com que os mineiros, depois de um dia inteiro de trabalho, deixassem seu subterrâneo com os corpos e as vestimentas encardidos dos pés à cabeça.

Costumamos imaginar que a sociedade colonial brasileira era, rigidamente, dividida em apenas duas classes, a dos senhores brancos e a dos escravos negros. Não era assim. O português é um povo, extremamente, românico, no sentido de herdeiro do legado civilizatório-cultural do antigo Império Romano. E em Roma era muito comum o costume da alforria, ou seja, o hábito de se oportunizar ao escravo a aquisição de sua liberdade. Nas Minas Gerais, as alforrias podiam se dar de várias formas, pelo batizado, pelo casamento, por disposição de última vontade ou até mesmo pela compra da carta de alforria pelo próprio escravo, sempre com intermediação da Igreja. Na mineração do ouro era muito comum o senhor permitir que o escravo embolsasse pequenos ganhos apurados nos domingos ou nos dias santos. Também eram comuns pequenos prêmios para o escravo que ultrapassasse uma cota de ouro estabelecida em determinada ocasião. Extravios de ouro também não eram poucos.

Assim, pouco tempo depois de ingressar na Encardideira, Chico já exercia sua liderança real entre os demais escravos, muitos deles seus antigos súditos, e conquistava a confiança de seu senhor e proprietário da mina, Augusto de Andrade, na medida em que os filões revelavam somas absurdas do metal precioso. Então, pelo preço de um quilo e meio de ouro que acumulou no trabalho extra, Chico comprou sua própria carta de alforria. Pouco tempo depois, comprou também a alforria do filho, Muzinga, e o libertou. Comprou outra, mais uma e não parou mais. Libertou todos os súditos que com ele haviam sido escravizados naquela Mina de Ouro. Logo, Chico era o único feitor a adentrar as galerias insalubres da Encardideira, que produziria ainda muito mais ouro até apresentar os primeiros sinais de possível exaustão. Então, já adoecido e julgando-a exausta, Augusto de Andrade vendeu a Mina da Encardideira para Chico, tornando-o o primeiro negro proprietário de lavra de ouro de Minas Gerais. Após o negócio, a Mina da Encardideira, milagrosamente, passa a produzir ainda mais ouro do que antes, milagre que é atribuído à Santa Efigênia, a santa africana. Então, Chico compra mais e mais alforrias e  manda construir no alto do Morro da Cruz a majestosa Igreja de Santa Efigênia, que é caiada com o ocre chamejante do minério da Encardideira .

A sociedade de antigamente era muito diferente da nossa atual. Ela era, por exemplo, muito mais organizada. Aos homens livres era, praticamente, obrigatória a associação às irmandades religiosas que regiam todos os aspectos da vida do indivíduo, desde os registros civis, passando pela alfabetização, formação ética, cultural, etc, indo até a assistência social.  E cada irmandade possuia seu estatuto e diretoria própria que era representada por um presidente. Assim, uma vez libertos, Chico e seus súditos se viam obrigados a se associarem a uma irmandade religiosa. A escolhida foi a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos Alforriados. Assim, em 6 de janeiro, data do calendário católico em que é comemorado o dia de Reis, no ano de 1747, ou seja,  muito antes de Dom João VI ser entronado rei, no Rio de Janeiro, Chico é, solenemente, coroado pelo bispo de Mariana rei da Irmandade do Rosário dos Homens Pretos e passa a viver com sua corte no Palácio Velho.

Também tendemos a pensar que antigamente não existia mídia. Outro erro. Característica marcante da sociedade mineradora do sec. XVIII é, justamente, a profusa adoção de diferentes meios de mídia, que eram quase todos monopólio da Igreja. Antigamente não existiam as mídias modernas, como o rádio, a TV e a internet. Todos os outros meios de mídia como a literatura, a pintura, a escultura, a música, o teatro, etc, já existiam há milênios. A própria missa, cuja freqüência também era obrigatória, constituía poderoso meio de mídia, assim como as imagens, os retábulos e altares barrocos, etc.  Outro meio de mídia, especialmente, marcante na sociedade mineradora do sec. XVIII eram as procissões religiosas. A única procissão do catolicismo é a de Corpus Christi. Em Ouro Preto, ainda hoje, há procissões religiosas quase que diariamente, muitas das vezes, mais de uma por dia. O mineiro é, extremamente, cerimonioso, midiático e as procissões protocolares pelas ruas dos núcleos mineradores, que também dependiam de autorização da Igreja, eram uma forma, sobretudo, de afirmação social, de circulação dos valores em que se fundavam as irmandades, de se influenciar e de se relacionar com as irmandades de outras paróquias, etc. 

Assim, naquele distante dia de reis do ano de 1747, Vila Rica foi surpreendida por uma procissão festiva que desconhecia. Agora, consagrado como Chico Rei e acompanhado de sua rainha e de sua corte, todos trajados em ricas indumentárias, o cortejo toma as ruas de Vila Rica numa numerosa procissão, que, seguida por músicos e dançarinos ao batuque dos tambores, caxambus, marimbas e ganzás resgatados do Congo, se desdobra em vários atos cerimoniais, encerrando-se num banquete triunfal.  E para se enquadrar ao ideário colonial, Chico Rei, habilmente, substitui o deus pagão Zambi-Apungo, de quem era sumo-sacerdote no Congo, pelas evocações à N. S. do Rosário. A esta festa se chamou Congado, em referência ao reino original de Chico Rei, o Congo.   

O desconhecimento de nossa história nos leva ainda a crer que nossa matriz cultural africana foi assimilada com mais intensidade na Bahía, ou no Rio de Janeiro. Também não é verdade. Foi em Minas Gerais.

O pragmatismo português, aliado ao costume das alforrias e conjugado à maior quantidade de ouro já descoberta pela humanidade, literalmente, comprou pela liberdade de dezenas de milhares de escravos. O que mais chamava a atenção de quem visitasse a Vila Rica do sec. XVIII, principalmente, dos estrangeiros que a visitavam, era seu imenso contingente de pretos, pardos e mulatos libertos.

 A sociedade mineradora constituia-se, na verdade, de um lado, por uma elite branca, do outro, por um enorme contingente de escravos negros e, entre os dois, um ainda maior contingente de ex-escravos, que, uma vez libertos, passavam a compor uma pujante e diversificada classe média, dedicando-se à prestação dos mais variados serviços a que o ouro podia pagar, como carpintaria, costura, sapataria, forjaria, transporte, construção, comércio e muitos outros extintos hoje em dia. Muitos se tornavam artífices. Foi a primeira vez que o Brasil flexibilizou o modelo rígido da Casa Grande/Senzala. Donde se depreende que a primeira classe média do Brasil é preta. Aliás, Vila Rica estava tão predestinada a ser preta que até seu ouro era preto. A peculiaridade específica do PH das águas do Rio Tripuí, cantado na Arcádia Mineira como “Pátrio Ribeirão”, associada à presença de ouro e de ferro em seu leito, resultava num fenômeno natural de galvanização que revestia as pepitas de ouro com uma finíssima camada escura de ferro. Daí, o nome Ouro Preto.    

Exemplar típico da classe média de Vila Rica, constituída por ex-escravos, é o de Antônio Francisco Lisboa, o Mestre Aleijadinho, que, desconhecido das novas gerações de brasileiros e venerado na Europa como a encarnação mulata de Michelangelo, era filho da escrava Isabel e foi alforriado pelo pai português, quando de seu batismo, tornado-se mestre-artesão de extrema qualidade, respeitado e demandado por toda Minas Gerais. 

O fenômeno da massificação das alforrias em Minas Gerais é, extremamente, importante para a compreensão de como se deu a assimilação da matriz cultural africana em nosso país. Os EUA, por exemplo, onde também houve emprego massivo de mão de obra escravizada de origem africana é, no entanto, muito menos africanizado do que o Brasil. Isso se deve ao fato de que nos EUA não se praticava o costume das alforrias. Era quase impossível um escravo adquirir sua liberdade nos EUA. Diferentemente, do que ocorria na América Portuguesa, conforme demonstra a trajetória de Chico Rei. É claro que muito se assimilou da Senzala. É inegável, por exemplo, que o prato nacional brasileiro, a feijoada, tem sua origem na Senzala. Mas, muito mais se assimilou por meio do imenso contingente de ex-escravos, também chamados de forros, que tanto marcaram e movimentaram a sociedade mineradora. Ouso dizer até que se Chico Rei não tivesse existido, não haveria nem samba no Brasil. No Carnaval, por exemplo, quem saia às ruas de Vila Rica em cortejos para tocar tambores africanos eram os forros, nunca os escravos.  Ao escravo era proibida a participação no Carnaval, a filiação a irmandades religiosas, etc. E muitos dos forros eram congadeiros. Os tambores que repicavam no Congado eram os mesmos tocados no Carnaval. Claro que o Samba não veio do Congado. Mas, foi a ascensão social do negro na sociedade mineradora, representada pelas dezenas de milhares de alforrias e pela posterior associação à irmandades do Rosário, que permitiu uma muito maior assimilação da matriz africana, que mais tarde, produziria o samba, pois o Congado se tornou um padrão de libertação e de inclusão social de escravos que se difundiu por quase toda a colônia. É muito difícil encontrar dentre as centenas de núcleos mineradores de Mias Gerais do sec. XVIII algum que não tenha sua Igreja de N. S. do Rosário dos Homens Pretos Alforriados e sua respectiva Guarda de Marujos. Muito além de Minas Gerais, ainda hoje existem Guardas de Marujos do Congado em São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Mato Grosso, Tocantins, Bahía, etc.  Como dito, a Proclamação da República não foi capas de derrubar a monarquia de Chico Rei.

Então, da próxima vez em que se deparar com um cortejo de marujos de N. S. do Rosário na rua, lembre-se que o Congado não é apenas folclore. Muito mais do que folclore, o Congado foi um padrão de libertação em massa de escravos e a primeira grande afirmação da cultura negra na sociedade brasileira, amplamente, responsável pela assimilação da matriz africana no Brasil. Não somos um país de degredados, como, falsamente, nos ensinaram nos bancos escolares. Somos um país de reis e rainhas. E um deles fundou as bases de seu reinado de maneira tão emblemática, extraordinária e transcendente que sua coroa ainda hoje pode ser vista a desfilar pelas ruas de Minas Gerais, etc, nas festas do Dia de Reis, N. S. do Rosário, São Benedito, Santa Efigênia, etc.                  

terça-feira, 20 de abril de 2021

Três Complicadores de um Trampolim para Fabrício

 Foto: reprodução de campanha.

Depois de ter passado o eleitor monlevadense  por uma série de prefeitos jovens que muito embora, apesar de  anunciadamente promissores, apresentaram pouco resultado administrativo nas últimas duas décadas, a eleição de Laércio no ano passado representou, sobretudo, o desejo do eleitor monlevadense em reviver a situação político-administrativa experimentada quando o chefe do Executivo exerceu seu primeiro mandato como tal, a partir de 1996. Em suma, diante do fracasso dos últimos prefeitos, o que queria o eleitor monlevadense era ver de novo o governo Laércio de 1996, que de fato, se comparado aos últimos, foi uma boa administração: a cidade era limpa, bem cuidada, havia atmosfera cultural, saúde e educação funcionavam muito melhores, apesar de muito menos recursos orçamentários, etc.  Mas, infelizmente, não foi o que aconteceu na composição política do governo. Depois de 100 dias de formado e já consolidado, é visível que o prefeito Laércio Ribeiro não conduziu a composição política de seu governo, de modo a repetir o bom resultado de 1996.  Ao contrário, as estruturas levantadas revelam que o atual governo Laércio foi, na verdade, montado como um trampolim para eleger Fabrício prefeito daqui a 4 anos. Neste caso específico e ainda diante do desejo do eleitor manifestado pelas urnas, o fato de ter-se montado um governo para eleger Fabrício prefeito na próxima eleição acaba esbarrando em três questões complicadoras.

A primeira delas é , justamente, o resultado administrativo, que o eleitor tanto deseja. Fabrício é um político de centro, ou seja, apresenta apoio em troca de cargos no governo, independente de qual venha a ser o espectro político com quem se negocia. Fosse político em Brasília, Fabrício seria do chamado Centrão, que são aqueles muitos partidos que votam com o governo em troca de cargos nas estatais e ministérios. O Centrão não tem lado político, não é de esquerda nem de direita, ele apenas busca se entranhar no governo, em troca de cargos. Daí, o conceito de fisiologismo. E foi o que Fabrício fez nos últimos 10 anos. Foi secretário no governo prandinista, foi base de apoio na Câmara do governo Teófilo, foi vice-prefeito no governo Simone/Moreira e agora é vice de Laércio.  Tudo, sem resultado político algum para o Município. Veja que Fabrício participou dos últimos três governos locais, justamente, aqueles de piores resultados administrativos nas últimas décadas. Nunca se viu, por exemplo, Fabrício se manifestar a favor ou contra as principais questões do Município, como o Bingo do Hospital Margarida, o hospital Santa Madalena, a péssima qualidade do serviço de transporte público, a imundice do Município, etc, etc.  E o motivo é simples. Ou as instituições municipais se engajam num projeto político de desenvolvimento para João Monlevade ou elas se engajam em projetos pessoais de poder. As duas coisas elas não podem fazer ao mesmo tempo. E ser eleito em função de um resultado que não será perseguido não é nada bom para a avaliação popular de nenhum governo.

A segunda questão complicadora é que um apoio para a candidatura de Fabrício poder-se-ia até ser articulada agora, desde que ela dependesse de um resultado positivo do governo Laércio, o que, definitivamente, não é o caso. O mais prudente a se fazer teria sido montar um governo desenvolvimentista, voltado para a produção de resultado administrativo e, a partir da consolidação de tal resultado, transmitir a boa avaliação do governo à Fabrício de modo a fortalecer a sua candidatura. Mas, não foi o que se fez.  Ao se montar um governo de centro para eleger Fabrício daqui a quatro anos, o mesmo passa a não depender do bom resultado político do governo Laércio pra tentar sua candidatura. Assim, independentemente, de Laércio obter ou não um bom resultado administrativo Fabrício virá candidato. Aliás, diante da conformação do atual governo, um possível resultado ruim da administração Laércio pode ser um cenário eleitoral até mais vantajoso para Fabrício, pois foi assim que ele agiu com a ex-prefeita Simone, o que novamente vai na contramão da obtenção do manifesto resultado desejado pelas urnas. Duvido nada que, diante do atual estado de coisas, em 2024 a chapa seja Fabrício e Simone, de vice.  

Por fim, a terceira questão complicadora de se formar um governo para eleger Fabrício em 2024 reside no adiantamento prematuro do processo eleitoral, o que, além de mais uma vez prejudicar o resultado administrativo, pois desvia o  foco da administração,  também pode tumultuar muito o campo político local, principalmente na Câmara, onde a maioria do governo é muito estreita.  






quarta-feira, 14 de abril de 2021

O Objetivo do Racismo Brasileiro é a Exploração do Trabalho

 

O texto é longo porque o assunto é sério.

Embora seja uma sociedade, brutalmente, racista, pouquíssima luz é lançada sobre o chamado racismo de cor brasileiro. No Brasil, racismo não se discute, não se esclarece e, portanto, não se supera. Pratica-se, sem pensar, como quase tudo neste país.  Contudo, não pode haver dúvida de que é apenas no conhecimento que reside o poder para superar o racismo, que causa tantas perdas ao Brasil. E acredito que a compreensão sobre o racismo brasileiro pode transcorrer muito mais facilmente, abordando-se o objetivo ou a finalidade a que se destina o racismo, em vez de insistir apenas no entendimento sobre seus efeitos, que são muito mais evidentes, apesar de pouco elucidativos.  A exclusão sócio-econômica e a marginalização de grande parte da população brasileira são efeitos visíveis do racismo. Mas, qual é o objetivo deste processo? A resposta é a exploração do trabalho.

A finalidade do racismo de cor brasileiro é sempre a exploração do trabalho alheio. Se dissermos isso, olhando para o século XVIII, em plena vigência da Escravatura Brasileira, fica muito mais fácil de enxergarmos como o racismo se presta à exploração do trabalho alheio. A figura histórica do escravo brasileiro, ou seja, daquele que, em função da estigmatização étnica, foi submetido ao trabalho forçado, não remunerado, é autoexplicativa. Hoje, a exploração racial do trabalho continua tal qual como no sec. XVIII, com a diferença apenas de que todos fingem que ela não acontece. O afro-brasileiro segue, na maioria esmagadora dos casos, sendo explorado em sua força de trabalho, recebendo em troca do trabalho duro que executa apenas com o que subsistir, como acontecia com os escravos do Brasil-Colônia. A abolição da Escravatura Brasileira foi apenas um lampejo de direito que, absurdamente, apesar de passados mais 130 anos de sua promulgação, ainda está muito longe de se materializar em sua plenitude.

Por escravo no Brasil-Colônia deve-se compreender aquele que se via forçado mediante violência moral e/ou física a renunciar à sua liberdade e à autonomia de sua própria vontade para se submeter ao trabalho forçado, não remunerado, em benefício de alguém.  O escravo não era sujeito de direitos, a não ser em relação aos direitos à moradia, à alimentação e ao vestuário básicos. Segundo a legislação da época, ao escravo a quem se negavam os diretos à moradia, à alimentação e ao vestuário era facultada a prerrogativa de peticionar junto ao ouvidor para que seu senhor fosse submetido às sanções aplicáveis. Os únicos direitos dos escravos eram, portanto os de morar, alimentar-se e vestir-se, basicamente.

Até o advento da máquina a vapor, a escravidão foi a regra na história da humanidade. Contudo, ela jamais foi associada à cor da pele.  A palavra “escravo” tem sua origem no termo “eslavo”, que designa povos europeus, de pele clara, cabelos e olhos claros, muito escravizados durante a Idade Média. Até então, a justificativa para a escravização se dava pela submissão militar dos povos. Na antiguidade, geralmente, quem vencesse a guerra passava a deter o direito de escravizar o derrotado. A escravidão só passa a se associar à cor da pele quando os Ingleses percebem o imenso potencial lucrativo que o tráfico de pessoas pelo Atlântico poderia representar no contexto de colonização das Américas, como de fato ocorreu. O tráfico forçado de gente para trabalhar nas Américas rendeu imensas fortunas aos ingleses. E como aquelas pessoas não haviam lhes feito nada para serem escravizadas, nem mesmo haviam lhes declarado guerra até por falta de motivos ou por causa da distância, os ingleses inventaram a chamada supremacia da “raça branca” como justificativa para o comércio de gente, lançando, convenientemente, sobre o tom escuro de pele o estigma da escravidão.  Tudo, devendo-se apenas à conveniência do lucro exorbitante, porque à luz da ciência, entre os seres humanos não há raças. Aliás, diante do chamado “racismo de cor brasileiro” o primeiro conceito a ser derrubado pela ciência é o de cor, já que segundo a Física, preto não cor, é ausência de cor. Não quero com isso martirizar os ingleses por terem concebido a doutrina do racismo, até porque também foram eles, posteriormente, a inventarem a máquina a vapor, que, como já mencionado, foi o advento tecnológico que possibilitou, tecnicamente, a abolição da escravidão no mundo moderno.  Não se pode julgar o passado com os parâmetros do presente. Outro ponto positivo sobre os ingleses é que eles não caíram na onda do nazismo na Segunda Grande Guerra, apesar de fundada na mesma doutrina da “superioridade da raça branca”, que naquela ocasião se mostrou tão hedionda e destrutiva ao mundo.

Para ser racista no Brasil não é necessário fazer um curso avançado de racismo, basta repetir o comportamento da sociedade brasileira. O racismo é velado no Brasil, apesar de visivelmente exposto na estrutura social do país.  No Brasil o racismo se assimila por meio das convenções, dos olhares, dos comportamentos, da mídia, dos enredos das novelas, e da estrutura social do país. Daí a definição de racismo estrutural.  Uma estrutura social que mudou muito pouco nos mais de 520 anos de história do Brasil e que, na verdade, apenas piorou depois da Abolição da Escravatura.

Durante a escravidão, não existiam favelas no Brasil. Sabe-se que os escravos eram alojados nas Senzalas, cujas condições de insalubridade nem pretendo abordar. Contudo, as Senzalas não eram excluídas, geograficamente. Nos Engenhos de Açúcar e nas Fazendas de Café, elas não distavam muito da Casa Grande e nos centros urbanos, como nas Minas de Ouro e Diamantes, as Senzalas se localizavam nos porões dos sobrados, etc. Os escravos domésticos, que eram muitos, geralmente se alojavam em algum cômodo da casa. Apesar de úmidas, escuras e insalubres, a Senzalas se localizavam dentro da cidade. Pouco depois de proclamadas a Abolição da Escravatura e a República, os ex-escravos foram excluídos das cidades brasileiras.

A Abolição da Escravatura ocorreu a 13 de maio 1888, tendo sido sancionada pela Princesa Isabel, a redentora. Estranhamente, não foram os liberais que aboliram a escravidão no Brasil. Talvez, por causa disso o país tenha sido o último a aboli-la. Logo após, em 1889, visivelmente, inconformada e escandalizada com a libertação dos escravos, os liberais se engajaram no golpe militar que proclamou a República e expulsou a Família Real do Brasil, iniciando uma fase da história brasileira caracterizada por um racismo exacerbado pouco abordado pela historiografia a que se chamaria de República Velha. Era uma época marcada pela ascensão de movimentos positivistas e integralistas, cujas bases doutrinárias se comunicavam com o mesmo ideário racista, que pouco mais tarde produziria o nazismo na Alemanha e todas as suas atrocidades contra a humanidade.  

Ocorre que a abolição de uma escravatura profundamente enraizada por mais de 350 anos não se concretizaria apenas com uma simples canetada, como foi o que apenas ocorreu. Obviamente, tratar-se-ia de procedimento complexo, composto de muitas etapas, das quais a liberdade então concedida pela Princesa Isabel seria apenas o primeiro passo. Significa dizer que para fazer o ex-escravo brasileiro deixar a condição de escravidão de fato, além de libertá-lo do cativeiro, seria necessário integrá-lo à sociedade, garantindo ao mesmo não apenas o direito à liberdade, como também a todos os demais direitos inerentes à cidadania como o acesso à moradia digna, à educação de qualidade, à saúde, à cultura, ao saneamento básico, ao ordenamento urbano,  aos demais serviços públicos, ao consumo, etc. Tudo o que jamais aconteceu, Dona Isabel não teve a menor chance. Logo depois de sancionada a Lei Áurea, os “liberais” conduziram um golpe militar que proclamou a Republica, expulsando do Brasil Dom Pedro II e a Princesa Isabel, brasileiros natos, nascidos no Palácio São Cristóvão, no Rio de Janeiro, para que não pudessem proceder à reforma agrária que garantisse acesso à terra e à moradia aos ex-escravos e a seus descendentes. Assim, é preciso compreender que a República foi proclamada no Brasil como instrumento para se interromper o processo de abolição da Escravatura Brasileira.   

Como já mencionado, neste período ainda não existiam favelas no Brasil. No Rio de Janeiro, por exemplo, primeira capital da recém proclamada República, os afro-brasileiros viviam numa série de numerosos e populosos cortiços que existiam no centro antigo da cidade. Eram cortiços, mas neles havia arruamento, ordenamento urbano, eles se localizavam dentro das paróquias que já se transformavam em bairros, etc, etc.  Era a cidade e, conseqüentemente, o acesso a todos os bens e serviços que ela podia oferecer.  Até que em 1902, assume a prefeitura do Rio, o prefeito Pereira Passos, cujo revisionismo histórico ainda há de condená-lo pelas suas políticas de exclusão. Pereira Passos promoveu a mais excludente reforma urbana já promovida no Brasil, ordenando a demolição dos cortiços existentes no centro do Rio de Janeiro, num procedimento sumário de expropriações e de despejos a que se chamou de “Bota-Abaixo”, no qual os afro-brasileiros foram, literalmente, expulsos de sua habitações, sem o direito a indenização ou  a qualquer acesso à moradia digna. Assim, expulsos da cidade e sem o direito de acesso à moradia, etc, os afro-brasileiros se viram obrigados a iniciar a ocupação dos morros cariocas, dando origem à triste e vergonhosa favelização do Rio de Janeiro. A primeira favela do Rio de Janeiro foi o Morro da Providência, onde se fixaram os ex-escravos despejados no Bota-Abaixo de Pereira Passos e os ex-combatentes da Guerra de Canudos, que, em sua maioria também eram ex-escravos.  E em certa medida tal fenômeno de exclusão, motivando pelo racismo, se repetiu pela maioria dos grandes centros urbanos brasileiros. 

Mas o que são as favelas? As favelas vão muito além da pobreza. A favela é a projeção da escravidão no Brasil contemporâneo. A favela é uma espécie de carma social do qual poucos podem se livrar, pois os instrumentos necessários para tal, se encontram todos fora dela.  A favela, não tem arruamento, ordenamento urbano, as habitações são, muitas das vezes, de tapumes. Na favela não há direito a vida, à liberdade, à educação, à saúde, etc, etc. Todos os serviços públicos, como abastecimento d’água tratada, recolhimento de esgoto sanitário, fornecimento de energia elétrica, etc, são super precários na favela e geralmente se dão por meio de gatos, etc. A favela não tem voz no Brasil, a não ser no resultado do Carnaval do Rio de Janeiro, daí sempre a genialidade de Darcy Ribeiro e Brizola, que deram voz aos excluídos, pelo menos uma vez ao ano. Hoje, a onda de fascismo declarado que atinge o país, nos permite a compreensão de que as favelas são guetos de invisível e massiva exclusão social, como foi o de Varsóvia, no holocausto nazista.

O Brasil tem em torno de apenas 20% de sua população enquadrada como de classe média, menos de 1% de ricos e mais de 75% de pobres e, principalmente, excluídos em favelas, alagados, palafitas, trapiches, em suma, guetos brasileiros de exclusão social em geral.  É a classe média brasileira quem desfruta o Brasil. É ela quem detém o monopólio da educação, do acesso aos cargos públicos, aos melhores serviços de saúde, ao consumo, etc. A classe média tem acesso a todos os bens e serviços do Brasil. É ela também quem instrui a opinião pública nacional. É a classe média que vai às ruas e derruba governos. A geografia da classe média é sempre muito bem definida, a classe média brasileira passa a vida inteira sem jamais colocar os pés numa favela.

Então, tem-se de um lado a menor classe média, dentre as 10 maiores economias do mundo, e do outro uma imensa maioria de trabalhadores da 6ª maior população mundial excluídos nas favelas. É isso sim, porque na favela todo mundo trabalha e dá um duro danado. Se algum dia, o morro não descer para trabalhar no Rio de Janeiro, por exemplo, a cidade pára. Só não trabalha na favela quem é atingido pelo desemprego. E mesmo assim, quem está desempregado se vira, 50% dos postos de trabalho na favela são de empregos formais e 50% são de trabalhadores autônomos informais. É óbvio que a exclusão social massiva de tantos trabalhadores no Brasil deixa seu efeito no mercado de trabalho brasileiro.  Ao excluir grande parte de sua população do acesso aos bens e aos serviços do Brasil, notadamente, do acesso à educação de qualidade, cria-se um imenso contingente de trabalhadores que não têm outra opção laboral, senão a de se dedicarem à uma série de trabalhos manuais, muitos deles pesadíssimos, que pelo excesso de oferta de mão-de-obra, se tornam muito mal remunerados no Brasil.  Não por coincidência, muitos desses trabalhos são os mesmos que eram executados pelos escravos dos séculos passados. Os “liberais” republicanos encontraram uma forma muito eficiente de, na prática, manter a escravidão no Brasil.

É muito difícil, o trabalhador que vive na favela conseguir mais do que um salário mínimo mensal. Ocorre que o salário mínimo brasileiro, hoje na ordem de mil e poucos reais, é o suficiente apenas para cobrir as despesas mensais com moradia, alimentação e vestuário.  Ora, se o escravo era aquele submetido ao trabalho forçado, cujos únicos direitos eram os de moradia, vestuário e alimentação e se após a vigência da Lei Áurea, ele foi expulso para as favelas, passando a trabalhar em contrapartida de um salário que só lhe rende, exatamente, o suficiente para o custeio da moradia, da alimentação e do vestuário,  onde foi que ouve Abolição da Escravatura no Brasil? É o que coloca por terra a teoria do racismo reverso. Não existe racismo reverso no Brasil, ou seja, racismo contra o branco, porque o branco jamais teve sua força de trabalho explorada no Brasil. Ora, se a finalidade do racismo é a exploração do trabalho, quem nunca teve o trabalho explorado não pode sofrer racismo, não o “de cor”.  

Esta imensa exclusão social brasileira causa ainda outra deformidade, desta vez no campo político, que é a falsa sensação de enriquecimento da classe média brasileira. Classe média é classe média, não é rica nem pobre. No entanto, no Brasil a classe média se considera rica, por isso é conservadora no campo político. E isso só ocorre porque ela se avalia, economicamente, em comparação com a miséria e a exclusão das favelas. Vale dizer, diante da miséria da favela, a classe média parece rica sim.  Quem explora a força de trabalho das classes C, D e E no Brasil é a própria classe média brasileira. E ao fazê-lo, classe média tem a miragem do enriquecimento, porque vê disponíveis diante de si a preço vil séries de prestadores de serviços e de trabalhadores, que em outra circunstância, ela não teria condições de contratar.  E se tem no Brasil um trabalho que pode ser muito representativo neste sentido é o de empregado doméstico. Nos países desenvolvidos quem tem condições de pagar por um empregado doméstico é só gente, verdadeiramente, rica. Os EUA, por exemplo, são uma sociedade, declaradamente, racista, mas muito menos exploratória em relação ao trabalho do afro-estadunidense. Nos EUA, todo trabalho rende um salário digno, capaz de cobrir muito além da moradia, vestuário e alimentação. No Brasil, não, o salário mínimo, que é o que recebem mais 70% dos trabalhadores, é tão baixo que qualquer um da classe média consegue contratar um empregado doméstico. Trata-se de uma herança direta do servilismo da Escravatura Brasileira, quando se considerava rico o senhor que possuía um escravo para cada tipo de atividade manual do cotidiano. A figura do empregado doméstico excluído na favela é uma verdadeira obsessão para classe média brasileira, pois sem ela não é rica nem pobre. Não é verdade que o racista não gosta do preto. Ele gosta sim, mas é no trabalho pesado, recebendo salário indigno.  E nada contra o empregado doméstico, pois se trata de um trabalho pesadíssimo e geral. Onde há casa há trabalho doméstico. O trabalho doméstico é o primeiro trabalho do qual ninguém poderia se furtar.  A não ser a classe média brasileira, que é incapaz de preparar suas próprias refeições, de lavar sua própria latrina e de manter a casa limpa, em ordem, etc. Nos EUA, o salário de um empregado doméstico é acima de dois mil dólares, mais de dez vezes o valor do salário mínimo brasileiro.  E é neste ponto específico que reside uma das maiores incongruências da classe média brasileira.  Como já mencionado, a exclusão social brasileira estrangula o crescimento econômico do Brasil, porque produz uma classe média muito diminuta e é ela quem tem acesso ao consumo. Uma classe média diminuta gera um consumo diminuto que reflete num PIB diminuto se confrontado com o imenso potencial econômico do país.  O Brasil somente desenvolverá todo o imenso potencial econômico que possui se empreender uma inversão na pirâmide social do país, ou seja, quando os mais de 70% de sua população deixarem a situação de exclusão social em que se encontram e ingressarem na condição de classe média. Este seria o Brasil do futuro que todos querem, mas que, em função do racismo velado, não nunca é alcançado. E tal estrangulamento acaba atingindo também a própria classe média, principalmente, nos momentos de crises econômicas e de desemprego, como o de agora, o que a obriga a migrar, sobretudo, para os EUA, a fim de ocupar os mesmos postos de trabalho que explora no Brasil: lava prato, banheiro, latrina, faz faxina, lava, passa, cozinha, construção civil, comércio, etc. E as conseqüências não são apenas sócio-econômicas. Muito pior, a exploração do trabalho no Brasil também produz um elevado custo humanitário ao país: 60 mil homicídios anuais.

Dentre as maiores democracias do mundo, o Brasil é a única que possui um modelo de segurança pública baseado em duas polícias, uma civil e a outra, militar. Segundo a Constituição, incumbe à Polícia Civil a função de polícia judiciária investigativa e à Polícia Militar, o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. A Polícia Militar é uma das poucas polícias do mundo que não investiga.  Ao contrário, o único instrumento que a Polícia Militar conta dentro do modelo de segurança pública é o emprego da letalidade. Mas, então, se o Brasil já possui uma polícia que é judiciária, por que existe a necessidade de uma segunda polícia que não investiga e que se caracteriza pelo emprego da letalidade? A resposta é para conter e subjugar as favelas.  Ora, se o Brasil é um país continental, que exclui grande parte de sua população em guetos de miséria, apesar de repleto de tantos e tão abundantes recursos naturais, o que se poderia esperar é a certeza da insurreição de seu povo. Mas, por que a gigantesca massa de excluídos não se rebela contra a exclusão?  A pergunta é por que o brasileiro não faz a Revolução Francesa? Porque existe todo um aparato militar, circulante nas ruas, cuja função, na prática, é  a de conter qualquer sinal de insatisfação popular nas favelas. E como não poderia ser diferente em se tratando de uma polícia militarizada, a contenção dos morros é feita mediante o emprego da letalidade. A Polícia Militar é aquela que efetua a prisão em flagrante delito e elabora o Boletim de Ocorrência que dará início ao inquérito policial. Contudo, quanto mais favelizada é uma localidade, maior será a atuação da Polícia Militar como força letal destinada a conter os morros e as favelas.  Em outras palavras, ao menor sinal de “desordem” nos morro a PM chega atirando e matando. Democracia é só para as classes A e B. As C, D e E vivem sob regime militar. Aliás, a Polícia Militar é um dos poucos serviços do Estado que adentram as favelas. O resultado é uma carnificina, 60 mil homicídios anuais, dentre os quais, de cada 10 mortos, 07 são de afro-brasileiros, excluídos nas favelas. É, sem dúvida, a pior face do racismo brasileiro. Nos EUA, depois de 3 anos e 60 mil mortos na Guerra do Vietnã, a opinião pública estadunidense se comoveu e se indignou tão profundamente com aquele número de perdas em vidas humanas, que fez com que aquele país se retirasse do conflito no sudeste asiático, de maneira até muito vexaminosa. Aqui, no Brasil, mata-se por ano o que se matou numa guerra inteira e não há a menor comoção. A opinião pública, ou seja, a classe média brasileira não se comove. É intrínseco ao sistema. Para se manter contida nas favelas a grande massa de excluídos de quem se explora a força de trabalho são, violentamente, mortas dezenas de milhares de pessoas por ano no Brasil. Mas, a PM não é apenas a polícia que mais mata no mundo, ela também é a que mais morre.  Ao conceber uma polícia que, em vez de se dedicar à investigação criminal, detém o emprego da letalidade, a sociedade coloca os policiais militares, literalmente, em linha de conflito armado, o que também lhes causa muitas baixas. E o assassinato rotineiro de policiais, no exercício de suas funções, é, talvez a mais grave comprovação de que falimos enquanto sociedade. Ademais, o atual modelo de segurança pública brasileiro, baseado em duas polícias, é extremamente ineficiente. Dos 60 mil homicídios anuais, ele consegue elucidar apenas 10%.

O Brasil é um país muito grande, diverso e complexo. Nem todas as pessoas que vivem nas favelas são pretas. Mas isso se deve muito mais à miscigenação da sociedade brasileira. Assim como nem todo preto se encontra excluído nas favelas, existem pretos de classe média, mas eles são a minoria. Não há dúvida que a origem das favelas no Brasil está associada à interrupção do processo de abolição da Escravatura, levado à cabo pela proclamação da República. Aliás, pode-se dizer que as favelas são uma projeção da escravidão no Brasil contemporâneo. E em se tratando de Brasil, o racismo de cor que a física diz que não é cor ainda tem o seu caráter hipócrita, porque todo aquele que é, verdadeiramente, brasileiro carrega sua ascendência na África, etc. Aqui em Minas Geras, por exemplo, todos temos uma bisavó que é preta, outra é índia, outra é filha de índio com preto e assim por diante.  E essa mestiçagem genética afeta muito a classe média que, não escapa à África e tem muito sangue índio nas veias, mesmo sem saber. No carnaval, a maior festa nacional, a hipocrisia racial é muito visível. Durante os quatro dias de folia, a classe média se organiza em blocos de ruas no Leblon, tocando tambores vindos da África, dançando o samba que é resultado da assimilação de ritmos africanos e, fantasiada de índio, celebra o deleite de desfrutar dos bens e dos serviços do Brasil, mas assim que chega a quarta-feira de cinzas, renega toda aquela brasilidade e passa a não ver com bons olhos o preto na universidade, no avião, no hotel, no restaurante, etc. É muita hipocrisia, pois não podemos negar aquilo que nos é fundamental.

A essa altura do texto, podemos enfim concluir várias coisas sobre o racista brasileiro. A primeira é que todo racista é um preguiçoso, pois não tem coragem de lavar a própria latrina. Segunda, que o racista é um falso rico, pois não paga um salário digno pelo trabalho que explora. O racista brasileiro ainda é incoerente porque migra para os EUA a fim de ocupar os mesmos postos de trabalho que explora no Brasil. O racismo brasileiro é gênero de terraplanismo já que se fundamenta em doutrina, não sustentada pela ciência. O racista é, brutalmente, violento e hediondo, porque só assim consegue manter o status quo. O racista também é hipócrita e desnaturado, porque renega a tataravó preta do Congo que todo brasileiro, de uma forma ou de outra, teve em Ouro Preto.          

O Brasil é produto histórico de Portugal. E Portugal é um país extremamente românico, no sentido de ser fiel depositário do legado civilizatório-cultural do Império Romano. A assimilação cultural dos povos sempre foi uma bem sucedida estratégia de desenvolvimento civilizatório de Roma. Lembrando que Roma não era apenas a Europa. Roma compreendia o sul da Europa, o norte da África e parte do Oriente Médio. O Brasil também é resultado da assimilação de diferentes culturas, basicamente, do índio, do branco e do preto. Depois vieram árabes, japoneses, hoje chegam muitos chineses, etc, etc. Daí não haver exagero em classificar o Brasil como a Roma Utramarinha, até mais completa do que a original, já que assimilou o componente indígena, ainda desconhecido na antiguidade e fundamental para o Brasil. Além de pretos e brancos, somos também muito indígenas, apesar de também não existir essa consciência. Para se ter uma ideia, com exceção do arroz e da farinha de trigo que foram trazidos pelos portugueses, toda a alimentação do brasileiro é de origem indígena, o feijão, a mandioca, o milho, as batatas, abóboras, etc. O Brasil é o país onde o mundo inteiro se encontrou e se assimilou. O Brasil é resultado de um muito precoce processo de globalização, do qual Portugal foi pioneiro.  E tudo isso é muito bom, pois não há de faltar nada para aquele país que assimila em si o mundo inteiro.

Então, podemos escolher se viremos ao mundo para sermos aqueles que tratarão o próximo com igualdade e justiça ou seremos seus opressores, explorando-lhe a força de trabalho. Seguiremos a manter a sociedade brasileira nos moldes de uma estrutura de trabalho atrasada do séc. XVIII, que tantos prejuízos causa ao país, inclusive um genocídio velado, ou vamos modernizá-la para que o Brasil possa aproveitar todo o seu imenso potencial socioeconômico, para se tornar a maior nação do mundo? Faremos valer o que subscrevemos na Constituição no sentido de que “todos são iguais perante a lei” ou seguiremos hipócritas, incoerentes e preguiçosos? 

Feito o conhecimento de causa, tudo passa a ser uma questão de juízo de valor.  A escolha é sua.

Incoerência Prandinista na Câmara


 

O resultado das últimas eleições revelou uma boa renovação na Câmara de Vereadores de João Monlevade. Pensar que o ultra-conservadorismo e o assistencialismo eleitoreiro do ex-vereador Sinval não tiveram recondução ao parlamento, depois de 20 anos, é um alento.

No entanto, nada alentadora foi a notícia da eleição do ex-prefeito, Gustavo Prandini, para uma cadeira no Parlamento local, depois de um auto-exílio político de 10 anos em Juiz de Fora, apesar de que, agora, como vereador, Prandini tem muito menos capacidade de levar o Município novamente à beira do abismo como fizera, há uma década, depois que fora eleito prefeito de João Monlevade (foto). A eleição de Prandini certamente não foi uma surpresa. Para um jovem político, que poderia ter sido reeleito em 2012, o que se podia esperar era, no mínimo, uma disputa para a própria Prefeitura em 2020, o que não pôde se concretizar diante do fracasso retumbante de seu único mandato em 2008. Aliás, em função da imensa rejeição popular que conquistou, Prandini sequer teve condição de tentar a reeleição ainda em 2012, o que faz de sua presença na Câmara uma espécie de prêmio de consolação, recheado de incoerência.   

Qualquer discurso que Prandini venha adotar no Legislativo será totalmente incoerente com tudo aquilo que ele fez ou deixou de fazer quando foi prefeito.    

terça-feira, 6 de abril de 2021

RH da Prefeitura é convidado a se desfiliar de partido


O chefe de Recursos Humanos da Prefeitura de João Monlevade, Adinei Freitas, foi, recentemente, convidado a desfiliar-se do P C do B mediante aprovação unânime da mesa diretora do partido, que integra a base de apoio ao governo Laércio Ribeiro.

Infiltrado no PC do B a mando do vice-prefeito Fabrício Lopes de quem é apadrinhado político de primeira ordem,  após a eleição de Dr. Laércio, Adinei tentou assumir a presidência do partido junto à Executiva Estadual em Belo Horizonte, apesar de afastado de suas funções partidárias em função de grave pendência ético-disciplinar interna. Adinei ainda confeccionou uma lista de filiados do PC do B, cujos nomes deveriam ter a participação recusada pelo governo Laércio Ribeiro para serem substituídos por cabos eleitorais de Fabrício Lopes que já é candidato a prefeito.  Aliás, montou-se um governo apenas para atender à obsessão de Fabrício Lopes em ser prefeito de João Monlevade. Como as pesquisas realizadas no último pleito demonstraram que Fabrício não tem votos para prefeito, ele se utiliza da estratégia de capturar partidos políticos numa tentativa de formar base de cabos eleitorais suficientes para elegê-lo. Tudo com conivência do gabinete do prefeito. Se Adinei foi aquele que entregaria o PC do B para Fabrício, Geraldo Giovani é aquele que entregará o PT numa bandeja de prata para o vice-prefeito.

Apesar de desfiliado do PC do B, Adinei segue lotado no super estratégico cargo de chefe de RH da Prefeitura. Só vai ficar no governo quem se engajar na já deflagrada candidatura de Fabrício. Todos os demais serão substituídos, mais cedo ou mais tarde.