terça-feira, 31 de agosto de 2021

Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade não é Aberta à Visitação

 

Sim, é verdade, existe uma Fábrica de Ferro Monlevade de pé. O conhecimento da história é essencial para determinar a forma como o cidadão lida com seu país. No Brasil, quando a história não é escondida, ela é deturpada. A alienação e a deturpação da histórica brasileira são instrumentos de dominação.   

No município de João Monlevade a situação da história local não é diferente. Durante décadas a história de João Monlevade foi, convenientemente, deturpada sob o estigma inventado de “uma pequena forja catalã”. E o que não foi deturpado, foi escondido.   Segundo os documentos históricos, o pioneiro estabelecimento metalúrgico de Monlevade foi a maior e mais importante Fábrica de Ferro a funcionar durante o Império Brasileiro e além, sendo o fornecedor preferencial de artefatos de ferro para as companhias inglesas mineradoras do ouro, como O Gongo Soco e o Morro Velho. “Uma pequena forja catalã” jamais existiu. Na verdade, sob o ponto de vista da estrutura do estabelecimento, as fábricas de ferro Monlevade foram três. A Fábrica Velha, que funcionou de 1828 à 1853, a Fábrica Nova, que Funcionou de 1853 a 1888 e a Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade que funcionou a partir de 1891. Nenhuma delas poder-se-ia considerar como pequena, pois foram as primeira a produzir artefatos de ferro e carvão em escala industrial. “Uma pequena forja catalã” jamais seria capaz de prover com artefatos de ferro a operação do Gongo Soco, que foi a mina que mais produziu ouro na história da humanidade.  Também não era uma forja catalã. Catalão era apena o método de obtenção do ferro, que produzia um metal de extrema qualidade, pouco quebradiço e, portanto, ideal para o emprego na mineração do ouro. Os equipamentos de forja das primeiras fábricas de ferro Monlevade eram ingleses e da Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade eram franceses e estadunidenses.    E o mais importante é que, ao contrário do que ficou escondido durante décadas, a terceira Fábrica de Ferro Monlevade ainda se encontra de pé.

Trata-se do belo e curioso edifício (fotos) localizado no Bairro Jacuí, onde a Arcelormittal instalou os geradores da Hidrelétrica do Jacuí. Apesar de toda deturpação que paira sobre a história de João Monlevade, algo acaba fugindo ao processo de alienação histórica e escapa à luz. É o caso da interessante fase estabelecimento metalúrgico, quando o meso passou a pertencer à Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros do Barão de Mauá. Não é fato histórico desconhecido que a Fábrica de Ferro Monlevade pertenceu à Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros. A grande maioria do acervo do Museu Monlevade, por exemplo, é constituída por equipamentos da fase da Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros e identificada como tal. Contudo, ate recentemente, não se sabia o que de fato havia ocorrido com o estabelecimento naquela fase. Mas felizmente, a partir do resultado de pesquisa postado aqui no Blog Monlewood, agora se pode saber que na fase da Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros foi completamente abandonado o local de funcionamento das primeiras duas fábricas que se situava onde hoje é a Rua dos Contratados, logo abaixo do Solar Monlevade, e construído em alvenaria de pedra, a partir de 1891, na margem esquerda do Rio Piracicaba, no Bairro Jacuí, o sólido, interessante e moderno edifício das fotos. Trata-se de uma construção tão sólida e apta a receber equipamentos industriais que, a partir de 1935 a Arcelormittal instalou nele a casa de máquinas da Hidrelétrica do Jacuí, jamais revelando que ali funcionara a Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade. Durante mais de 80 anos a Arcelormittal manteve escondido dos munícipes que o edifício que hoje alberga os geradores da Hidrelétrica do Jacuí foi construído com capital da Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros para abrigar a terceira Fábrica de Ferro Monlevade, alienando assim do monlevadense o conhecimento de parte importante de sua história e de sua identidade.

Muito embora hoje funcione como uma usina geradora de força, o edifício da Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade deve e pode ser aberto à visitação, pois é o que ocorre com a maioria das hidrelétricas. Trata-se de evidente atração turística, já que, além de carregado de história, o edifício do Jacuí é uma construção como nenhuma outra. Ele se encontra localizado, literalmente, sobre a margem do Rio Piracicaba, apoiado por uma série de colunas arqueadas, por entre as quais a água retorna para o leito do mesmo, depois de passar pelas turbinas.  Seu telhado tem um formato muito curioso e parece uma manta asfáltica. Sobre o teto existem dois grandes exaustores de gazes espiralados que parecem coisa do desenho Os Jetsons. Ele possui ainda vitrais imensos, é super iluminado. Imagina-se como deve ser ainda mais interessante por dentro.  O edifício da Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade no Jacuí. Trata-se de monumento histórico  tão importante quanto o Solar Monlevade que foi a morada e a sede administrativa da Fazenda Carvoeira, Mina e Fábrica de Ferro homônima  e que era o único dos tempos dos Monlevade que ainda se julgava de pé no Município. Coisa que também não era verdade. Dos tempos dos Monlevade, ainda está de pé não somente o Solar, como também a última Fábrica de Ferro deles. Esta aí, a Fábrica de Ferro que faltava e que, depois de descoberta, precisa ser aberta à visitação para bem da formação da identidade e até o turismo local.              

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

O Relatório de 1853 de João Monlevade

Infelizmente, quando a Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros encerrou suas atividades no Rio de Janeiro, a Biblioteca e os inúmeros arquivos e registros gerados por quase um século de funcionamento da Fazenda Carvoeira, Mina e Fábrica de Ferro Monlevade foram extraviados para a capital fluminense, encontrando-se ainda hoje em local incerto e desconhecido. É imensamente frustrante não poder contar com tais documentos para se aprofundar mais sobre a tão negligenciada história da maior e mais importante Fábrica de Ferro a funcionar no Brasil Império. 
Contudo, como Monlevade foi a principal autoridade metalúrgica do Brasil, durante o sec. XIX, é possível encontrar muitos registros a seu respeito em coleções de outras personalidades históricas que lhes foram contemporâneas. É o caso do Relatório de 1853, redigido pelo próprio Monlevade a pedido do governador de Minas, Diogo de Vasconcelos, e disponível para consulta no Arquivo Público Mineiro na respectiva coleção. No referido relatório, Monlevade responde, como a maior autoridade metalúrgica que era, a cinco quesitos formulados pelo governador de Minas. 
Trata-se do principal documento hoje disponível sobre a Fábrica de Ferro Monlevade, instalada a partir de 1828. Também é considerado o primeiro registro histórico sobre a imensa riqueza ferrífera de Minas Gerais já que nele Monlevade deixou registrado que “na Província de Minas, além de inúmeras camadas de mineral de ferro, mais ou menos extensas, existem cinco principais cordilheiras; e pode-se afirmar que uma só delas encerra mais ferro do que todas as da Europa reunidas, atendendo não somente a sua extensão e poder, como a riqueza do mineral, o mais rico que se conhece; pois que analisado quimicamente contem 76 % de seu peso em ferro”. O documento ainda traz uma pormenorizada descrição sobre a primeira e a segunda Fábrica de Ferro Monlevade, revelando os principais serviços do estabelecimento, os mercados consumidores, a construção de pontes e estradas, a utilização dos carretões de quatro rodas, puxados por muitas juntas de bois, o transporte de peças de ferro forjado de mais de 900 quilos de peso para o Gongo Soco e o Morro Velho, o trânsito de numerosas tropas, o principal produto da fábrica, aspectos importantes da força de trabalho escrava, a utilização da água do Ribeirão Carneirinhos para a movimentação dos martelos, ventiladores dos fornos, laminadores, engenhos de serra, moinhos e muito mais. 
É um documento que vale a leitura pelo português impecável com que fora redigido, apesar da ortografia arcaica, e, sobretudo, por se tratar da voz do próprio Monlevade. O Relatório é datado de 12/12/1853. O mês de dezembro é especialmente chuvoso. Acredito que naquele dia Monlevade deve ter se levantado bem cedo, como de costume e, fazendo sua rotineira inspeção matinal a partir das quatro faces avarandadas do Solar homônimo, viu a dificuldade que aquele aguaceiro todo impunha aos principais serviços do estabelecimento e deve ter pensado “para não perder o dia, vou redigir as respostas encaminhadas pelo governador”. Publico a seguir, com exclusividade, o Relatório de Monlevade de 1853, o mais importante documento histórico hoje disponível sobre parte da grandiosa obra do patrono do Município (clique sobre a imagens para dimensioná-las à leitura):




 

quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Subsídio para a Enscon é Vergonhoso e Irresponsável


 

É, realmente, vergonhoso e irresponsável o subsídio que o governo Laércio/2024/Fabrício/Candidato pretende conceder à Enscon, concessionária do serviço de transporte público urbano.

É vergonhoso porque a Enscon presta um serviço de péssima qualidade e o preço da tarifa é um dos mais caros de Minas. Hoje, a Enscon não é fiscalizada em absolutamente nada pela administração pública, apesar de faturar milhões e de prestar um serviço publico de natureza essencial, diretamente, ligado ao direito de ir e vir dos munícipes. A Enscon não cumpre o contrato que celebrou com o Município e nunca foi punida por isso. Ela não respeita os horários, itinerários nem os trajetos que os coletivos devem percorrer, tudo de acordo o que é mais lucrativo para ela. Ela coloca ônibus na hora que ela quer e do jeito que ela quer. A Enscon, por exemplo, suprimiu os trocadores, reduzindo pela metade sua folha de pagamentos, mas jamais fez repercutir tal economia no preço da tarifa. Ao contrário, abocanhou-a como lucro, colocando dezenas de mães e de pais de família na rua.  É irresponsável porque é a Enscon quem comunica à Prefeitura quantos quilômetros, quantos passageiros, quanto de combustível, quanto de pneu, etc, foram contabilizados naquele mês.  Ela não é mais fiscalizada, não existem mais aqueles fiscais da Prefeitura que colhiam os dados a bordo dos coletivos nos pontos finais. É como se fosse a raposa quem comunicasse quantos ovos o galinheiro produziu naquele mês. Além disso, a planilha de custos, utilizada no Conselho Municipal de Transporte (CMT) para compor o preço da tarifa é obsoleta e obscura, de modo que não permite a aferição do lucro da empresa. É obvio que a empresa busca o lucro, mas por se tratar de prestação de serviço público essencial, seu lucro não pode ser exorbitante. Há 30 anos, o CMT reajusta o preço da passagem de ônibus, sem conhecer o lucro da empresa. É como alguém conceder aumento de salário para um funcionário sem saber quanto ele ganha, ou alguém pagar pelo abastecimento do carro, sem saber quantos litros foram colocados no tanque. A planilha de custos da Enscon é um cheque em branco avalizado pelos prefeitos. E dar cheque em branco é coisa de gente irresponsável, sobretudo, quando se trata de dinheiro público. Assim, se agissem como mínimo responsabilidade, a primeira providência a ser tomada para se discutir a concessão de subsídio à Enscon seria revelar para o povo o lucro dos últimos 60 meses da empresa, coisa que ninguém nunca fez, nenhum vereador. E o repasse do transporte escolar que o Município faz para Enscon? Durante a pandemia, as aulas presenciais foram suspensas, junto do transporte de estudantes, e o que aconteceu? A Prefeitura seguiu realizando os repasses para Enscon? Ninguém tocou no assunto.    

“Garantia do transporte público no Município” se faz com fiscalização, transparência e cumprimento do contrato pela empresa, não com subsídio financeiro. Se a empresa pede subsídio, a primeira coisa a ser reavaliada é sua capacidade econômica de prestar o serviço. E quem não tem capacidade econômica, apesar do imenso favoritismo que tem desfrutado,  não pode prestar um serviço público da envergadura do transporte coletivo. O governo municipal perdeu uma ótima oportunidade de rescindir o contrato com a Enscon, por descumprimento contratual, e   realizar uma licitação com ampla concorrência de modo a melhorar qualidade do serviço e o alto preço da tarifa. Mas ao contrário, preferiu subsidiar o péssimo serviço prestado pela Enscon, o que tem lhe causado imenso desgaste. Para quem ainda estava a acreditar que o governo Laércio/2024/Fabrício/Candidato representava a mudança, está aí o subsídio da Enscon para comprovar o contrário.     


Prefeitura não comunica sobre intervenção no Solar Monlevade


 

O Conjunto Arquitetônico do Solar Monlevade, que foi a morada do patrono do Município e sede da Fazenda Carvoeira, Mina e Fábrica de Ferro Monlevade é tombado para fins de preservação, conforme disposto na respectiva Lei Orgânica:

 Art. 170. Ficam tombados, para o fim de preservação, e declarados monumentos naturais, paisagísticos, artísticos ou históricos, sem prejuízo de outros que venham a ser tombados pelo Município:

[...]

IX - o conjunto arquitetônico original da Fazenda Solar;

Significa dizer que qualquer intervenção que venha a ser realizada no Conjunto Arquitetônico do Solar Monlevade depende de aprovação prévia do Conselho Municipal de Patrimônio Histórico.

Recentemente, como pode ser visto pela foto acima, a Arcelormittal instalou andaimes, telas e tapumes em volta do Solar Monlevade, de modo a se concluir que o mesmo sofre algum tipo de intervenção.

Contudo, até o momento, a Prefeitura não comunicou absolutamente nada a respeito da intervenção ora sofrida pelo Solar Monlevade, nem sobre a necessária aprovação do Conselho Municipal de Patrimônio Histórico, nem sobre o que realmente ocorre naquele que é um dos mais valorosos monumentos históricos da cidade. E se não houve a devida autorização, a Prefeitura se encontra de braços cruzados por quê?

Como se vê, a política de preservação do patrimônio histórico de João Monlevade segue obscura como sempre, o que, sem dúvida, vem alimentando o absurdo histórico de destruição e de modificação de bens culturais, tristemente, verificado aos longos das últimas décadas no Município.    

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

João Antônio de Monlevade: o Pioneiro da Indústria Metalúrgica do Brasil

Jean Antoine Félix Dissandes de Monlevade (imagem acima) nasceu na região de Guerret, na França, no ano de 1789. Oriundo de uma família nobre, concluiu o curso de Engenharia de Minas na Escola Politécnica de Paris, em 1812. A formação de Monlevade não se limitava, todavia, à engenharia de minas, tendo profundos conhecimentos nas áreas de literatura, filosofia, ciências naturais, mineralogia, geologia e metalurgia. Graças a seu talento, foi incorporado ao Corpo de Engenheiros Militares da França, onde dominou as técnicas de análise química de minerais, as técnicas metódicas de obtenção do ferro pelo processo catalão e por meio de alto-forno, as técnicas de obtenção do carvão vegetal pelo sistema de medas, as técnicas refinadas de forja, solda, laminação, torneamento e moldagem do ferro, além das de construção civil e mecânica, topografia, etc, etc.  Em 1817, Monlevade conseguiu uma permissão do seu superior para efetuar a viagem ao Brasil, participando de uma comissão do governo francês, incumbida de estudar os recursos minerais de Minas Gerais, naquela onda de naturalistas estrangeiros que se seguiu à transferência da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro.  Monlevade chegou ao Brasil em 14 de maio de 1817. Já em Minas Gerais, João Monlevade visitou minas e jazidas de várias cidades e vilas mineiras, como as de São João del Rei, Tiradentes, Congonhas, Ouro Branco, Ouro Preto, Mariana, Sabará, Curral del Rei, Caeté, Santa Bárbara, Catas Altas, Barão de Cocais, São Gonçalo, São Miguel do Piracicaba, Itabira, Serro, Antônio Dias, etc,  a percorrer toda a extensão da Serra do Espinhaço, com exceção de Diamantina, sempre realizando estudos e confeccionado relatórios mineralógicos que eram remetidos para a Escola Politécnica de Paris. É de Monlevade, por exemplo, o primeiro registro histórico sobre a imensa riqueza ferrífera de Minas Gerais. Naquele relatório, Monlevade registrou:

 “Na Província de Minas, além de inúmeras camadas de mineral de ferro, mais ou menos extensas, existem cinco principais cordilheiras; e pode-se afirmar que uma só delas encerra mais ferro do que todas as da Europa reunidas, atendendo não somente a sua extensão e poder, como a riqueza do mineral, o mais rico que se conhece; pois que analisado quimicamente contem 76 % de seu peso em ferro”.

É visível que a cada estudo mineralógico que fazia, Monlevade se impressiona mais e mais pela a imensa riqueza ferrífera de Minas Gerais, o que fez com que ele buscasse dar utilidade a todo aquele ferro. Monlevade via o ferro como um agente civilizador. Mais tarde ele profetizaria: “o futuro grandioso desta terra, hoje tão decadente, não está no ouro, nos diamantes, mas sim no ferro este grande agente da civilização, como da segurança dos estados, e sem o qual os países os mais civilizados em poucos anos estariam reduzidos ao estado selvagem”.    

Assim, em 1818, a inquietude de Monlevade instalou um alto-forno em Caeté, onde produziu muito ferro moldado na Fazenda do Rio Preto. O estabelecimento metalúrgico só não prosperou em função da ausência de matas suficientes para o fabrico em escala do carvão.  Desse modo, não foi correto comemorar os duzentos anos da chegada de Monlevade aonde hoje é o município homônimo, como fez a Câmara de Vereadores local em 2017, haja vista que em 1818 Monlevade ainda se encontrava a morar em Caeté, onde foi pioneiro em proceder à primeira corrida de alto-forno. Contudo, o êxito na fundição do ferro e na moldagem de vários artefatos úteis em Caeté tornou seu nome conhecido, sendo o mesmo indicado para orientar a exploração da Galena do Abaeté, promissora mina de prata e chumbo, onde Monlevade revelou toda sua inclinação para alquimista, apurando dela pelo processo químico, 9.000 quilos de chumbo em barras e um botão de finíssima prata. Durante o período em que trabalhou na Galena de Abaeté, Monlevade conheceu João Batista Ferreira de Souza Coutinho, o futuro Barão de Catas Altas, com quem manteria estreito laço de amizade, ninguém menos do que o homem mais rico da região, então proprietário da fabulosa e quase mitológica Mina de Ouro do Gongo Soco.

Após sua experiência siderúrgica em Caeté, Monlevade prestou uma série de serviços para o governo da Província de Minas Gerais, procedendo à análise química da pureza e à medição quantitativa de várias jazidas minerais e Minas de Ouro.

Então, em 1826 ocorreu o fato que foi determinante para que Monlevade se tornasse o maior e mais bem sucedido metalúrgico residente no Brasil durante o sec. XIX: a fundação da Imperial Brazilian Mining Association, a Companhia Mineradora do Gongo Soco.

No segundo quartel do sec. XIX, as minas de ouro superficial, de fácil acesso e extração, constituídas por depósitos sedimentares das encostas dos morros e das margens dos ribeiros e até mesmo as encardideiras macias de Ouro Preto, já apresentavam considerável queda de produção. Contudo, segundo os estudos e as medições mineralógicas feitas pelo próprio Monlevade, ainda existia muito, muito ouro. Mas, para extraí-lo seria preciso o emprego de outras técnicas. Era o ouro de veio, cuja extração demandaria a abertura e o escoramento de galerias subterrâneas, o emprego do trem de vagonetes sobre trilhos e a utilização do Engenho Mineiro de Pilões, equipamento mecânico movido por roda d’água, cuja montagem e manutenção demandariam a produção de muito ferro forjado para triturar o mineral aurífero.  Como também registraria o próprio Monlevade, em Minas Gerais o ouro ocorre associado ao minério de ferro e, no caso do ouro de veio, o filão é encontrado entre as camadas de ferro e a formação de um veeiro de quartzito, que é uma pedra muito dura. Daí, a necessidade do emprego do Engenho Mineiro de Pilões para triturar o duríssimo quartzito extraído das galerias subterrâneas, antes da lavagem para apuração final do ouro.    Inaugurava-se assim em Minas Gerais a fase mecanizada de mineração do ouro, constituída pela fundação de numerosas companhias mineradoras do ouro, as maiores delas de capital inglês e as mais famosas as do Gongo Soco e do Morro Velho, e pelo estabelecimento da Fábrica de Ferro Monlevade. Tratou-se de uma nova era na mineração do ouro, em Minas Gerais, caracterizada pelo emprego de novas técnicas e equipamentos mecânicos de mineração, que é  considerada pela historiografia como o alvorecer da indústria mineira. E caberia a Monlevade produzir o ferro demandado pela mineração mecanizada que então se inaugurava, sobretudo, as cabeças dos trituradores dos Engenhos Mineiros de Pilões que eram blocos de ferro forjado de 80 quilos de peso, chamados de mãos de pilão, que depois de 90 dias de funcionamento contínuo necessitavam ser substituídas por outras novas, além de peças de ferro muito maiores, de mais de 900 quilos de peso e todo  tipo de ferragem.

Assim, logo depois de vendida a Mina de Ouro do Gongo Soco pelo Barão de Catas Altas aos ingleses da Imperial Brazilian Mining Association, Monlevade casou-se, em 4 de janeiro de 1827, na Matriz de Caeté, com a sobrinha de Catas Altas, Clara Sophia de Souza Coutinho, com quem teria dois filhos: João Pascoal de Monlevade e Mariana Sophia de Monlevade.

A experiência siderúrgica anterior de Monlevade em Minas Gerais, obtida na Fazenda do Rio Preto, em Caeté, o ensinara que para fundar a Fábrica de Ferro capaz de produzir peças em escala suficiente para atender a fase da mineração mecanizada que se iniciava seria necessário o fabrico diário de grande quantidade de carvão, o que não fora possível de se concretizar em Caeté devido a ausência de matas em abundância para tal naquela localidade. Monlevade também sabia que para atender àquela nova demanda por ferro necessitaria também importar da Inglaterra pesado equipamento industrial, cujo transporte para o interior de Minas Gerais só seria possível por meio de navegação pelos rios Doce e Piracicaba. Assim, o local escolhido por Monlevade, que já havia percorrido toda a Serra do Espinhaço, para instalar sua Fábrica de Ferro deveria conjugar os fatores seguintes: ocorrência de matas suficientes para a produção em escala do carvão vegetal; acesso ao Rio Piracicaba para transporte dos equipamentos industriais; situar-se numa das cordilheiras de ferro descritas por Monlevade; potencial hidráulico para fornecer a força motriz dos equipamentos da fábrica e pouca distância do Gongo Soco, etc. O local escolhido que reunia todos aqueles fatores acabou situado na margem esquerda do Rio Piracicaba, a poucos quilômetros de São Miguel, onde Monlevade já havia realizado estudos mineralógicos e hoje é o município homônimo. 


Então, em 1827, 10 anos após sua chegada ao Brasil é que Monlevade veio a fixar-se no local, onde a seria o município que leva o seu nome, dando início à construção do Solar Monlevade (foto acima), imponente sobrado de quatro faces que seria sua morada, até o dia de sua morte, aos 83 anos de idade, e a sede administrativa da Fazenda Carvoeira, Mina e Fábrica de Ferro Monlevade, por mais de um século. Naquele mesmo ano, também teve início a um dos episódios mais extraordinários da obra metalúrgica de Monlevade no Brasil: o transporte das pesadas máquinas, importadas da Inglaterra e necessárias para o estabelecimento de sua Fábrica de Ferro. 



Um corajoso sócio de Monlevade, chamado Lourenço Aquiles Lenoir, organizou uma pequena expedição de duas ou três canoas e desceu os rios Piracicaba e Doce até o litoral do Espírito para certificar-se se seria, realmente, possível navegar rio acima, transportando as pesadas máquinas que seriam adquiridas na Inglaterra, empreitada jamais tentada, numa época em que os respectivos vales eram habitados por índios guerreiros antropófagos. Finalizada a viagem de ida com sucesso, Lenoir concluiu pela viabilidade do transporte e imediatamente rumou para Europa a fim de adquirir a pesada maquinaria. De volta ao porto do Rio de Janeiro, com a preciosa e pesadíssima carga, Lenoir navegou pelo litoral num barco a vela de dois mastros rumo a foz do Rio Doce, em Regência no Espírito Santo, onde os martelos de forja, apenas um deles pesando 1200 quilos, as duas Rodas de Areage, o Grande Massame, o Laminador, etc, foram desembarcados e baldeados para bordo de 12 imensas canoas militares (foto acima), numa verdadeira operação de guerra, coordenada por outro ilustre Frances, Guido Thomaz Marliere, Comandante das Divisões Militares do Rio Doce e Diretor Geral dos Índios. 





A Expedição Monlevade (mapa) rio acima transportou 7.500 quilos de carga, abrangeu 3 estados brasileiros, totalizou 1.100 quilometros percorridos, 7 meses de viagem e foi tripulada uma centena de índios guerreiros da nação Krenak. Chegou exitosa ao local escolhido para estabelecer a Fábrica de Ferro, em 8 de abril de 1828.

A partir daí, Monlevade deu início à fundação do estabelecimento metalúrgico que se consagraria como a principal Fábrica de Ferro a funcionar durante o Império Brasileiro, tornado-se o fornecedor preferencial de artefatos de ferro para as Companhias Mineradoras do Ouro. Sua Fábrica de ferro não foi a primeira do Brasil e não era a única, mas foi a pioneira em contar com a divisão do trabalho e a produzir em escala industrial carvão, ferro e artefatos forjados. Também foi pioneira em produzir peças de ferro forjado de quase uma tonelada de peso, as maiores até então já forjadas no Brasil e em transportá-las até seus clientes, alguns a mais de 120 quilômetros de distância como a Mina do Morro Velho, em Nova Lima.

Monlevade é considerado pela historiografia como maior construtor de estradas carroçáveis em Minas Gerais no sec. XIX,  muitas delas dotadas de pontes. Do Solar Monlevade partiam 6 ramos de estradas carroçáveis ligando a Fábrica de Ferro a seus clientes e mercados consumidores. Ainda hoje elas são utilizadas pelo modal rodoviário local, compondo uma rede de caminhos que se integram de maneira muito especial à Estrada Real, já que por eles eram escoadas peças de ferro para a mineração do ouro, podendo ser considerada o circuito da Estrada Imperial do Ferro. O traçado da principal avenida do Município, a Getúlio Vargas, coincide com o percurso da estrada por onde transitavam os carretões de quatro rodas de Monlevade, puxados por muitas juntas de bois, que escoavam a produção da fábrica e por onde também transitavam muitas tropas que mantinham negócios com o estabelecimento ou vinham, simplesmente, atravessar as pontes mantidas por Monlevade sobre os rios Piracicaba e Santa Bárbara ou chegavam para comprar ferraduras, cravos e ferramentas pela ferrar. Monlevade foi a Meca dos Tropeiros (vide ).         

Na verdade, aquela espécie de slogan que nos ensinaram nos bancos escolares como “uma pequena forja catalã, fabriqueta de enxadas” jamais existiu. De fato, sob o ponto da estrutura do estabelecimento, existiram 3 fábricas de ferro Monlevade e não apenas uma. A Fábrica Velha, que funcionou de 1828 a 1853. A Fábrica Nova que funcionou de 1853 a 1888 e a Fábrica de Francisco Monlevade, que funcionou de 1891 em diante. As duas primeiras se localizavam abaixo do Solar Monlevade, onde hoje é Rua dos Contratados. Delas só restaram poucas ruínas. A terceira funcionou onde hoje é o Bairro Jacuí. Ela ainda está de pé e foi adaptada para funcionar atualmente como uma hidrelétrica. A fábrica também não era catalã. As máquinas para a Fábrica de Ferro Monlevade não foram importadas da Catalunha, mas sim da Inglaterra, como já descrito acima. O mesmo maquinário foi utilizado para equipar a segunda Fábrica de Ferro. E a Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade, no Jacuí, foi equipada com maquinário estadunidense e frances. Catalão era apenas o processo de obtenção do ferro, que produzia um metal puro de extrema qualidade e pouco quebradiço. Também não era a enxada o principal produto da Fábrica de Ferro. Monlevade produzia enxadas e tudo mais que fosse possível se fabricar em ferro forjado naqueles idos, contudo seu principal produto eram as cabeças dos trituradores dos Engenhos Mineiros de Pilões que eram blocos de ferro forjado de 80 quilos de pesos cada. O estabelecimento também não era nada pequeno. A primeira Fábrica de Ferro Monlevade produzia quase 500 quilos de ferro e 6.000 quilos de carvão diariamente, contava com seis fornos de fundir ferro, de 80 quilos cada um, e quatro tendas de ferreiros. Utilizava as águas do Ribeirão Carneirinhos, etc, para girar duas poderosas rodas hidráulicas que moviam os  3 grandes martelos de forja. A água do Ribeirão Carneirinhos, etc, também impulsionava o vento dos ventiladores das fornalhas.  Contava ainda com 150 escravos e outros 50 colaboradores diretos. Durante o longo tempo em que funcionou, foi a primeira e a única a fabricar peças de ferro forjado de uma tonelada de peso, as maiores produzidas no Brasil até então. Assim, é preciso passar uma borracha sobre o estigma de “uma pequena forja catalã, fabriqueta de enxadas”, eis que na verdade o estabelecimento metalúrgico de Monlevade foi a maior e mais importante Fábrica de Ferro a funcionar no Brasil Império, fornecedora preferencial de artefatos de ferro das Companhias Mineradoras do Ouro, estando inserido diretamente no circuito da Estrada Real.  

O maior cliente da Fábrica de Ferro Monlevade foi, sem dúvida, a Mina de Ouro do Gongo Soco. De 1826 a 1856, com os artefatos de ferro produzidos por Monlevade, o Congo Soco produziu nada menos do que  27.887 quilos de ouro puro, algo sem precedente ou paralelo no mundo, tornado-o a mina aurífera que mais produziu ouro na história da humanidade. E parte deste ouro coube a Monlevade, fazendo dele uma das maiores fortunas de Minas Gerais no sec. XIX. Certamente que “uma pequena forja catalã”, não faria de Monlevade uma das maiores fortunas de Minas em seu tempo. 

Então, também não é verdade aquilo que nos ensinaram nos bancos escolares no sentido de que o ciclo da mineração do ouro em Minas Gerais durou apenas o sec. XVIII. A Mina do Gongo Soco, por exemplo, foi a maior Mina de Ouro da história da humanidade no sec. XIX. O Morro Velho segue em funcionamento até os dias atuais.

Além das cabeças dos trituradores dos engenhos mineiros de pilões, que eram o principal produto da Fábrica de Ferro,  Monlevade também produzia aguilhões, bigornas, engenhos de serrar madeira, moendas para espremer cana de açúcar, etc. 


O Catálogo de Preços (imagem acima) impresso da Fábrica de Ferro Monlevade revela que o estabelecimento ainda produzia enxadas, enxadões, machados, ferraduras para mulas e cavalos, cravos, ferramentas para ferrar,  pregos, fechaduras para portas, tachos, bigornas, ferro em barra, argolas para eixos, cavilhas de tarraxa e porca, correntes, ferragem de carro e ferragem de engenho de serra.  A verdade é que a Fábrica de Ferro Monlevade esgotava as possibilidades de forjar o ferro em objetos úteis, sendo capaz de fazer de tudo que fosse possível em ferro forjado. Há registro de mestres-ferreiros da Fábrica Monlevade que confeccionaram dois relógios de parede e uma máquina de costura. 



A imagem de Monlevade também sempre esteve muito associada aos engenhos hidráulicos, rodas d’água que movimentavam uma diversidade de máquinas. E a principal delas era o Engenho Mineiro de Pilões (foto acima), equipamento mecânico muito difundido na região que contava com um grande número deles em funcionamento e cuja ferragem não apenas era produzida em Monlevade, como também era ele quem fornecia a assistência técnica para mantê-los em operação.   

Monlevade foi a maior autoridade metalúrgica e mineralógica do Brasil durante o sec. XIX.  Tanto foi assim que ele era comumente conhecido como Capitão Monlevade e pouco depois de sua morte em 1872, a lacuna deixada por este competente metalurgista fez necessária a criação da Escola de Minas de Ouro Preto que, inclusive, tentou adquirir os registros e a Biblioteca que Monlevade colacionou durante o longo tempo em que viveu no Brasil.

Outra característica marcante de Monlevade era sua inclinação para viajante. Antes de se fixar a pouca distancia de São Miguel, Monlevade já havia viajado por toda Minas Gerais, com exceção do Distrito Diamantino do Tijuco. E depois de se fixar, Monlevade jamais parou de viajar. Estava sempre em viagem para manter em bom estado as estradas carroçáveis que abria e mantinha e para prestar assistência técnica às Companhias Mineradoras do Ouro.    

Monlevade foi um exemplo perfeito de completa adaptação ao Brasil.  Ele aportuguesou o próprio nome, de “Jean Antoine Félix Dissandes de Monlevade”, passando a assinar “João Antônio de Monlevade”. Adotou o Português como língua. Trocou a dieta européia a base de trigo pelo feijão, pela mandioca e pelo milho. Casou-se com uma brasileira e viveu até seu último dia no Brasil, onde foi sepultado.  Foi o primeiro a produzir e a forjar em escala o ferro brasileiro.

A fase da mineração mecanizada do ouro, tecnicamente, viabilizada, por João Monlevade deixou uma marca tão indelével na construção da identidade regional que ainda hoje a herança daqueles idos pode ser observada no jeito de falar do mineiro. Nas maiores companhias de mineração, como o Gongo Soco e o Morro Velho, que pertenciam aos ingleses, falava-se apenas o inglês. A convivência com os ingleses das companhias mineradoras fez com que o mineiro incorporasse em seu vocabulário uma série de vocábulos de origem inglesa, que tornaram seu jeito de falar muito típico. Manter o processo de mecanização sempre funcionando não era tarefa fácil. Qualquer interrupção no processo mecanizado era imediatamente acompanhada de uma cobrança por parte do patrão inglês, que exigia saber o porquê do ocorrido. Então o inglês indagava ao mineiro o tempo todo: “why (?)”, que é a tradução de “por que (?)”. Daí a origem da interjeição “uai”, tão utilizada pelo mineiro para exprimir surpresa, espanto ou dúvida. “Sô”, que em Minas é utilizado como pronome de tratamento e “trem”, que é utilizado pelos mineiros como sinônimo de qualquer coisa, também são originários do convívio dos mineiros com os ingleses nas companhias mineradoras do ouro. “Trem” é referente ao “train” de vagonetes, sob trilhos, que eram empregados nas companhias mineradoras para extrair o minério aurífero das galerias subterrâneas; “sô” é a adaptação do vocábulo “sir”, que era como os ingleses eram tratados nas companhias. E “ué”, que é utilizado pelo mineiro para expressar desorientação geográfica, tem sua origem no inglês, “where”, cuja tradução é “onde (?)”.



Das duas primeiras Fábricas de Ferro Monlevade existem hoje apenas ruínas. Contudo ainda há uma Fábrica de Ferro Monlevade de pé (foto acima).

Depois de abolida a escravidão no Brasil em 1888, Monlevade já havia falecido há 16 anos e coube a seu neto, o engenheiro Francisco Monlevade, filho de João Pascoal Monlevade, reajustar o estabelecimento à nova ordem econômica e aos ventos da Revolução Industrial. Sem contar com o capital necessário para modernizar a indústria do avô segundo as exigências da época, Francisco Monlevade vendeu a propriedade à Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros do Barão de Mauá, por 1 mil contos de réis, mediante a condição de permanecer à frente da administração do estabelecimento. Nesta terceira fase do empreendimento, foi completamente abandonado o antigo local, abaixo do Solar Monlevade, estabelecendo-se a casa da nova oficina na margem esquerda do Rio Piracicaba (foto acima), abaixo do que é hoje a Represa do Jacuí. Neste período, a Fábrica de Ferro Monlevade foi, integralmente, submetida aos efeitos da Revolução Industrial, sendo equipada com uma série de maquinismos impressionantes, entres os quais se destacam o Martelo-Vapor estadunidense (foto abaixo) e a Turbina Hidráulica francesa de 600 cavalos. Quase todo o acervo do Museu Monlevade é, atualmente, composto pelas máquinas da Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade, que produzia 4 vezes mais ferro do que as duas primeiras do avô. E o mais interessante é que o prédio que abrigou a Fábrica de Ferro de Francisco Monlevade ainda existe e, atualmente, alberga a casa de máquinas da Represa do Jacuí, no bairro de mesmo nome. 

Por fim, tema que não pode deixar de ser abordado, quando se discorre sobre Monlevade é a escravidão, principalmente, depois de incendiarem a estátua do bandeirante Borba Gato.  Como mineiro, não me cabe a defesa de nenhum bandeirante. O maior feito realizado pelos bandeirantes foi a descoberta das Minas de Ouro. Aliás, as Minas de Ouro foram descobertas dentro do próprio território da Capitania de São Paulo que era imenso e se entendia de Santa Catarina até o Mato Grosso. Depois de descoberto o ouro, os bandeirantes paulistas intentaram em manter para si o monopólio do controle e da exploração das minas. Eles então provocaram a Guerra dos Emboabas, perderam o conflito e foram expulsos das Minas de Ouro. As Minas de Ouro então se separaram da Capitania de São Paulo e foi fundada a Capitania de Minas Gerais. Donde se conclui que bandeirante bom é bandeirante expulso de Minas Gerais. Contudo, Borba Gato era traficante de escravos, coisa que Monlevade jamais foi.  Monlevade foi um empreendedor do ramo mineral e metalúrgico e como qualquer empreendedor no Brasil até 1888, formou e utilizou mão de obra escrava. Se tivermos de queimar, de apagar ou de desconsiderar a história em função da escravidão, teremos de desconsiderar Roma, o Egito, a Babilônia e toda a história do Brasil até 1888, o que não podemos fazê-lo, sem imenso prejuízo ao conhecimento histórico e a construção de nossa identidade brasileira. O período mais importante da história do Brasil foi justamente aquele em que houve escravidão. Não podemos apagá-lo ou queimá-lo.  O que temos de queimar é a cara de vergonha para encararmos o pesado legado deixado por uma escravidão abolida apenas no papel, cujos descendentes ainda têm a força de trabalho explorada no Brasil, tal qual como antes.