segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

FARRA DO LIXO: PARECER DE PROCURADOR DE JUSTIÇA É PELA CONDENAÇÃO DE MOREIRA


A Farra do lixo, como ficou conhecido o maior escândalo de corrupção já desbaratado no Município de João Monlevade ainda não acabou em pizza, apesar das muitas manobras jurídicas e das alterações na Lei de Improbidade Administrativa. Tramita no Tribunal de Justiça de Minas Gerais recurso de apelação interposto pelo ex-prefeito Carlos Moreira & Companhia, contra sua condenação por ato de improbidade administrativa na Ação Civil Pública que apurou uma série de fraudes e de abusos cometidos na vigência do contrato de recolhimento do lixo urbano que, na época em que Moreira foi prefeito, resultaram num prejuízo de mais de 4 milhões de reais aos cofres públicos de João Monlevade. Atualizado, o prejuízo ao erário chega próximo de 20 milhões de reais.

O autor da denúncia foi o advogado Fernando Garcia (euzinho), que, exercendo o controle social da coisa pública, efetivou uma pequena investigação que concluiu pelas irregularidades, requerendo cópia do edital, do contrato e dos aditivos para formular a representação junto ao Ministério Público local que iniciou a ação.  

Em parecer recente datado de 12 de fevereiro de 2025, o Procurador de Justiça titular do caso narrou toda a ação delituosa praticada pelos envolvidos, opinando pelo desprovimento do recurso e a conseqüente confirmação da condenação de Moreira nas seguintes sanções: I - ressarcimento integral do dano, cujo valor deve liquidado em momento próprio, considerando se a diferença entre o preço médio de mercado à época face à quilometragem prestada e o preço pago pelo Município de João Monlevade, ai incluídos os sucessivos reajustes, durante toda a vigência da contratação; II - suspensão dos direitos políticos por seis anos; III - pagamento de multa civil em uma vez o valor do dano; IV - proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.

Após a aludida apresentação do parecer do Procurador de Justiça, o processo da Farra do Lixo deve ser concluso à relatoria que deve pedir pauta para julgamento ainda no primeiro semestre deste ano. Se confirmada a condenação, Moreira segue inelegível para os próximos 15 anos.    

 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

A Fome de 1700, a Culinária Mineira e a Origem do Pão de Queijo

 


O pão de queijo é uma grande iguaria da culinária mineira. Recentemente o pão de queijo foi eleito um dos alimentos mais gastronômicos do mundo. Agora com fama internacional, a origem do pão de queijo mineiro está relacionada a um evento traumático que definiria a culinária mineira para sempre: a grande fome de 1700.
A notícia do descobrimento de ouro no interior do Brasil atraiu, de uma forma ou de outra, imenso contingente de pessoas vindas de todas as partes da América Portuguesa, da África e de Portugal. Em pouco tempo havia cerca de 30 mil almas garimpando o metal precioso no entorno das minas gerais do Ouro Preto, Mariana, etc. Naquele início, Portugal ainda não havia compreendido o tamanho colossal das jazidas. A capitania de Minas Gerais ainda não havia sido fundada, toda a zona mineradora pertencia à Província de São Paulo e o aparato estatal português ainda era inexiste. As rotas de tropeiros para o abastecimento de alimentos também não haviam se estabelecido e diante daquela imensa quantidade de ouro que se encontrava com relativa facilidade à flor da terra, ninguém admitia a paralisação da atividade mineradora para plantar uma horta ou uma roça de produto agrícola. Segundo o padre português Antonil, autor do primeiro registro histórico sobre o descobrimento do ouro no Brasil, em apenas duas braças de uma data aurífera, era possível se extrair uma arroba de ouro puro 24 quilates, isto é, 15 quilos do vil metal. Ao contrário, diante daquela riqueza astronômica, os primeiros mineiros acreditavam que poderiam comprar todo o alimento disponível no mundo e não se preocuparam com a alimentação. Contudo, sem abastecimento, instalou-se a fome, levando à morte muitos mineiros. Assim registrou Antonil:
[...] não se pode crer o que padeceram ao princípio os mineiros por falta de mantimentos, achando-se não poucos mortos com uma espiga de milho na mão e uma pepita de ouro noutra, sem terem outro sustento.”
No mesmo sentido, registrou o então governador do Rio de Janeiro, Artur de Sá e Menezes:
“[...] pela grande fome que experimentam e que chegou a necessidade a tal extremo que se aproveitaram dos mais imundos animais, e faltando-lhes estes para poderem alimentar a vida, largaram as minas, e fugiram para os matos com os seus escravos a sustentarem-se com as frutas agrestes que neles acharam”.
Impelidos pela fome, muitos mineiros abandonaram suas datas e desceram o Rio Piracicaba à procura de alimentos. Rapidamente, o som do repico das enxadas, pás e picaretas trabalhado incessantemente foi substituído pelo silêncio. As minas se despovoaram despovoadas. Antônio Dias foi um que se viu forçado a abandonar a sua mina e a descer o rio a procura de alimentos. Ao longo da excursão em busca de alimento acabou descobrindo outras grandes quantidades de ouro em Santa Rita Durão, Rio Piracicaba, Nova Era e na localidade que levaria o seu nome, Antônio Dias Abaixo.
A Fome de 1700 deixou um legado profundo e marcante na Culinária Mineira em seus modos de preparo e na utilização dos ingredientes. Em Minas Gerais, por exemplo, quando se abate uma criação, nada dela é desperdiçado, nem o sangue, porque para combater o contexto da fome é preciso racionalizar a fonte de alimento, aproveitando tudo que for possível. Daí a origem de um prato muito iconográfico e gastronômico da culinária mineira que é o Frango ao Molho Pardo, preparado com o sangue da ave. Naquele contexto de fome, quem tivesse um frango com que se alimentar, e ele custava literalmente seu peso em ouro, o fazia sem dispensar nada dele nem mesmo o sangue do animal que era empregado no preparo do prato. Em Minas é muito comum o chouriço do sangue do porco e miúdos em geral como a moela do frango e a língua do boi. São muito famosas a dobradinha, feita do estomago do boi e o Mocotó, feito do tutano do osso também do boi. Durante algum tempo o alimento que se tinha disponível nas minas era o milho triturado no pilão e cozido, daí a origem da famosa canjiquinha mineira. O costume de fritar banana verde também tem origem na Fome de 1700 já que quem se alimenta de banana verde o faz porque tem necessidade imediata e não tem tempo para esperar a fruta amadurecer. Da bananeira o mineiro ainda faz o umbigo de banana e o palmito interno do caule da planta que é picado e servido refogado. E além do emprego de ingredientes que em condições normais são dispensados, a Culinária Mineira ainda é rica nas maneiras de preparo de modo que muitos pratos diferentes podem ser preparados com os mesmo ingredientes.
Ainda dentro do contexto da Fome de 1700 destaque especial deve se dar ao queijo, pois as primeiras tentativas de abastecer as Minas de Ouro de mantimentos, sobretudo por parte dos portugueses, ocorreram através do queijo. No Brasil, o queijo tem origem portuguesa. Uma vez cientes do desabastecimento, muitos do imenso contingente de portugueses que imigraram para Minas, o fizeram trazendo consigo o queijo. O queijo é lindo, é saboroso é redondo, macio e uma importante e prática fonte de proteína, justamente, o nutriente mais escasso durante a fome. O queijo ainda é fácil de ser transportado pelas tropas, resistindo bem à viagem, inclusive a marítima de travessia do Atlântico, podendo ainda ser armazenado em casa por algum tempo.
Diante da grande dificuldade inicial de abastecimento de víveres em Minas Gerais, o mineiro via o queijo como uma reserva estratégica de combate à fome, que em geral não era consumida imediatamente. O mineiro guardava o queijo em casa para se proteger do desabastecimento e somente o consumia em último caso. Neste processo de armazenamento do queijo, algumas peças endureciam a massa e se perdiam. No entanto, como a fome ensinara o mineiro a não jogar alimento nenhum fora, ele ralava o queijo seco, acrescentava o polvilho, gordura, sal, enrolava a massa em formato de um pequeno pão e o assava. Posteriormente, com a evolução da receita, foram acrescentados os ovos. E assim, da fome e da necessidade, se originou o pão de queijo mineiro, lembrando ainda que o próprio polvilho é um subproduto do processo de fabricação da farinha de mandioca, que nem sempre é aproveitado. Ou seja, fazer farinha naquela situação de fome, sem tirar o polvilho e destiná-lo à alimentação, era um sacrilégio impensável para o mineiro.
Posteriormente, com a fundação da Capitania de Minas Gerais, o estabelecimento das rotas dos tropeiros para o abastecimento e o fausto do ouro, etc, a Culinária Mineira se diversificou e se multiplicou, comprando de tudo do mundo inteiro, sem nunca perder a sua origem e passando a produzir, inclusive, seus próprios queijos igualmente premiados mundo afora.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Duplicação da BR-381

Recentemente, o presidente Lula assinou o termo de concessão da BR-381, que prevê a finalização da duplicação da rodovia, a instalação de praças de pedágio, entre outras coisas.

Tristemente alcunhada de Rodovia da Morte, apenas no trecho entre João Monlevade e Belo Horizonte, tido como o mais perigoso, existem 200 curvas. Em toda a sua extensão, de São Paulo a Governador Valadares, a BR-381 mata perto de 200 pessoas por ano.

Boa parte do trecho da 381 entre João Monlevade e Belo Horizonte que conhecemos hoje foi instalada na década de 1950 pela Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira (vídeo anexo), seguindo o traçado dos antigos caminhos das tropas e dos carros de bois existentes deste o século XIX entre a Fábrica de Ferro Monlevade de 1828 e Sabará. Por isso aquele trecho tem tantas curvas.   Para as tropas as retas não importavam, mas sim a topografia capaz de firmar as quatro patas da mula no chão. Não existem retas nos diversos ramos da Estrada Real.  Eles foram sempre abertos obedecendo a topografia dos contornos das numerosas serras existentes, o que produzia muitas curvas e quase nenhuma reta. E a Belgo-Mineira nunca foi especialista em aberturas de estrada. Considerando ainda o grande aumento da velocidade média advindo da evolução dos veículos desde a sua instalação, a rodovia delineada pelos caminhos tortuosos das tropas, então se transformou numa carnificina. Não é difícil para qualquer cidadão monlevadense indicar, pelos menos, 10 pessoas conhecidas que perderam a vida na 381.

Situação muito diferente da encontrada nos trechos já duplicados da rodovia, que eliminaram o traçado das tropas com a instalação de viadutos vertiginosos, pontes e túneis. Mesmo as curvas existentes obedecem a um padrão de ângulo aberto que se repete por todo o traçado. As curvas da nova 381 são todas iguais, situação muito diferente do traçado anterior. Aliás, comparando o traçado da nova com o da velha 381 é possível concluir que a região nunca teve uma estrada decente. A nova 381 é quase uma Autobahn, que é o conceito de excelência de rodovia. O novo traçado não ficou livre de acidentes. Nele têm sido comuns, por exemplo, o tombamento dos bi-trens  por excesso de velocidade, que costumam ser fatais.  Mas, as colisões frontais, que eram as mais comuns e mais letais não mais ocorrem nos trechos duplicados.    

Neste contexto, é preciso deixar registrado que foi a presidente Dilma quem iniciou o processo de duplicação da BR-381. E que a partir de seu impeachment, a duplicação foi suspensa, sendo retomada somente agora, quase uma década depois. Assim, o golpe contra Dilma foi especialmente caro para a região. Espero que o Lula termine a duplicação da Rodovia da Morte para que seu terceiro mandato possa deixar algum legado para a região, porque até agora nada de concreto.  Diante da escalada do custo de vida, a impressão que se tem é que não houve mudança de presidente.


História de Monlevade:Vídeo da Visita do Governador Bias Fortes às Obras de Expansão da Belgo Mineira, na Segunda Metade da Década de 50


Filmagem realizada nos anos 50, contendo imagens dos trabalhos de ampliação da rodovia Vitória/Minas (atual BR-381), das obras de expansão da Companhia Belgo Mineira e da Fazenda Solar. Destaque para a presença do Governador de Minas, José Francisco Bias Fortes, do Diretor Superintendente da Usina, Dr. Joseph Hein, de funcionários da siderúrgica, de autoridades do Município e outros.