quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Testemunho Bolsonaro


Então, Bolsonaro foi eleito presidente da República. E, agora, o que esperar para os próximos anos no Brasil? A implementação de toda a sua retórica, ora. 
Infelizmente, boa parte do eleitor brasileiro votou em Bolsonaro, acreditando que aquela retórica inflamada que caracteriza a extrema-direita não seria implementada, era apenas um blefe, uma forma de oposição à situação estabelecida. O eleitor de Bolsonaro depositou o voto cego. O medo e o ódio cegaram-no. Cá entre nós, é bem verdade o brasileiro contemporâneo não é muito de tomar decisões imbuído da razão, do pensamento lógico, pelo simples motivo de não se encontrar habilitado para tal. È preciso relembrar que em 1966, dois anos após o Golpe de 64, a Ditadura instalada no país excluiu dos currículos escolares a matéria filosofia, que é a disciplina que ensina o indivíduo a pensar, a raciocinar. O ser humano não nasce habilitado ao pensamento, ele aprende a pensar, se for submetido à formação filosófica. Em 1968, o ano mais conturbado do regime, a mais tradicional e fecunda escola de filosofia do Brasil,o Colégio do Caraça, ardeu em chamas, encerrando suas atividades. A filosofia só voltaria a ser obrigatória no Brasil em 2014, já havendo projeto de lei em tramitação no parlamento para suprimi-la novamente dos currículos escolares. E não adianta cobrar do brasileiro aquela formação que o país não lhe deu. Ninguém pode dar aquilo que não tem. Sejamos sinceros, o Brasil contemporâneo é um país passional. Um país que tem a agricultura que alimenta cerca de 1 bilhão de pessoas no mundo e, ao mesmo tempo caminha para regressar ao mapa da fome da ONU não pode ser considerado racional. Aqui, não temos formação filosófica consolidada, os conceitos filosóficos não circulam na grande mídia. Aqui, não formamos senso crítico, apenas repetimos os enredos das novelas da Globo. Se sentimos ciúmes, vamos lá e matamos, se temos raiva, agredimos, se sentimos inveja, vamos lá e sabotamos a vida do próximo, até porque todo comportamento que é exibido pela grande mídia tende a ser replicado na sociedade e a nossa grande mídia são as novelas da Globo. E foi assim, como num enredo da novela das 21 horas, o brasileiro conduziu seu voto a urna. Inicialmente, Bolsonaro encontrou apoio quase que maciço no ódio da classe-média brasileira que se ressentiu com a ascensão social das classes C, D e E , ocorridas nos governos Lula e no primeiro mandato da Dilma. Fica a lição: o ressentimento da classe-média pela ascensão do pobre constituiu na ultima década, talvez, o maior entrave para o desenvolvimento socioeconômico do país. O atentado ocorrido em Juiz de Fora também confundiu o eleitor e alavancou a campanha de Bolsonaro para além dos 20% de intenção de votos representados pela classe-média . E por fim, houve o fenômeno do arrebatamento, impulsionado pelas notícias falsas ou fakenews e gerado pela sensação de risco que se fez circular em torno da possibilidade de não haver mudança, sobretudo, no quadro econômico do país. O eleitor foi convencido de que o PT quebrou o país. O que, de certa forma é verdade, mas não por descontrole fiscal e, sim por falta de estratégia política diante de uma oposição que adotara a política da terra arrasada. No momento em que a Dilma fora reeleita, em 2014, o déficit público era de 2,5% do PIB. Comparativamente, quando FHC se reelegera em 1998 , o déficit chegou a 4,5% do PIB, quase o dobro, e naquela ocasião ninguém levantou a bandeira de que o país estava quebrado nem deu impeachment no presidente da República por conta de “pedaladas fiscais”, que ainda não foram conceituadas, tecnicamente. Para se ter uma ideia, aos países da Zona Euro, que se submetem a rigorosos programas de controle de gastos, é facultado um déficit de até 3% do PIB. Então, de acordo com os números, naquele momento o país não estava quebrado. Mas, a Rede Globo insistiu muito no tema e uma mentira dita mil vezes pela Globo, invariavelmente, se torna uma verdade no Brasil. Foi, então, que Dilma, recém reeleita, deu posse como ministro da Fazenda, Joaquim Levy, aquele que teria integrado a equipe econômica de Aécio, caso ele tivesse sido eleito, e o mesmo que Bolsonaro agora indica para a presidência do BNDS. Uma vez nomeado para a Fazenda, Joaquim Levy,ultra- liberal da Escola de Chicago, tratou logo de restringir, duramente, uma série de programas de transferência de renda como o auxílio-doença, pensão por morte, o seguro-defeso, seguro-desemprego, abono salarial, etc, dando um verdadeiro cavalo de pau na economia brasileira. As medidas de Levy repercutiram imediatamente gerando graves efeitos na economia, principalmente, na situação de pleno emprego que o país experimentava. Aí sim, o Brasil rapidamente ultrapassou a marca de 10 milhões de desempregados, o que reduziu muito a atividade econômica, comprometendo sobremaneira a arrecadação da União e dos estados. Estava, então, instalada a crise econômica que perdura ate os dias atuais. Muitos chamaram as medidas de Joaquim Levy de punhalada fiscal contra Dilma. Foi o erro derradeiro da Dilma. A partir daí, a péssima situação econômica do país precipitaria seu impeachment. Mas não foi o único erro do PT. Mesmo antes de isso acontecer, o PT já havia errado muito. Errou quando esteve no poder e deixou de realizar a reformas que João Goulart fora impedido de fazer pelo Golpe de 64. Tivesse, por exemplo, realizado as reformas dos meios de comunicação, democratizando o acesso e dividindo entre outras três emissoras o monopólio da TV brasileira concedido à rede Globo, dificilmente, teria sofrido o impeachment. Tivesse também realizado a reforma política, não teria, necessariamente, que se envolver na corrupção sistêmica de Brasília para formar maioria no parlamento. Foram erros que custaram muito caro à nação brasileira. Mas se o PT pagou um alto preço da falta de estratégia e coerência política, custo muito maior pagaram os tucanos, autores do impeachment da Dilma. Nas últimas eleições gerais, sobrou pouca coisa dos tucanos, enquanto que o PT ainda se manteve como um partido competitivo na disputa pela Presidência da República. Pois é, veja como o voto cego é perigoso. Joaquim Levy, que quebrou o Brasil no governo Dilma, agora será presidente do BNDS do governo Bolsonaro. Considerando o histórico recente, será que a o anuncio de Levy para a equipe econômica de Bolsonaro pode ser encarado como algo esperançoso a quem se encontra desempregado há 4 anos? Acho que não, já no segundo ano do mandato de Bolsonaro o Brasil deve chegar aos 15 milhões de desempregados. E o brasileiro, agora, também se enraivece contra as projeções muito sombrias que surgem em relação ao futuro governo Bolsonaro. Raiva à parte, é mais uma vez recorrendo-se à filosofia, que também embasa a ciência política, que se pode traçar o perfil de como será o governo Bolsonaro, o que se faz possível através das análises do conteúdo programático, do discurso e do espectro político ocupado por Bolsonaro. Então vejamos, Bolsonaro é um político de extrema-direita, ou seja, conservador. A extrema-direita é aquele gênero político que nutre a ideia de que o Estado tem a função de proteger a propriedade privada e nada mais. O Estado, portanto, não deve intervir na economia, distribuir renda, manter serviços de saúde, educação, nada. Considerando que a observação dos últimos 30 anos da história brasileira revela que o país somente chegou a se tornar uma economia de consumo em massa, ultrapassando a Inglaterra e tornado-se a sexta maior economia do mundo, o quarto maior mercado de automóveis e um dos maiores mercados de computadores, celulares, etc, além do grande boom na construção civil, quando o Brasil optou por distribuir um pouquinho da renda nacional. Bolsonaro não vai distribuir renda. Pode-ser que num primeiro momento, alguns setores da economia até apresentem algum crescimento. Mas será muito mais em função de uma demanda reprimida, resultado dos últimos vários meses de recessão do que qualquer outra coisa. A economia no governo Bolsonaro de deve variar pouco muito daquela vivenciada no último mandato de FHC: baixo crescimento, desemprego monstruoso e inflação baixa em razão do baixo consumo. A história recente já demonstrou que o consumo das classes A e B não são suficientes para manter aquecida a economia do país. Para tal faz-se necessário o consumo das classes C, D e E, o que não deve acontecer no próximo governo. Bolsonaro é conservador, então ele deve conservar ou aumentar o rentismo nacional que hoje representa quase 50% da despesa da União. Muito pouco sobrará para obras de infra-estrutura, etc. Assim, pode-se concluir que o orçamento de Bolsonaro deve ser muito generoso com os banqueiros e pouco preocupado com a saúde, a educação, a cultura, etc. Acredita-se que Bolsonaro deva colocar muito dinheiro nas Forças Armadas, podendo até se meter em algum conflito na região. O eleitor de Bolsonaro agora deve ficar atento a convocação compulsória para combater comunistas nas Venezuela. No campo dos direitos humanos, o Brasil deve viver um grande retrocesso. Desespera-se que já nos cem primeiros dias de governo, Bolsonaro aprove a flexibilização do Estatuto do Desarmamento. Na questão das liberdades individuais não se sabe quão longe Bolsonaro pode ir. Para o meio ambiente desespera-se mais devastação, sobretudo, da Amazônia. Na questão da soberania nacional, desespera-se total submissão ao Tio San, a entrega definitiva do Pré-sal , da Embraer, da Base de Alcantara, etc. No tema das reformas institucionais, o que se desespera é a ausência completa delas. Como já dito, Bolsonaro é conservador e, portanto, conservará todas as estruturas que hoje definem o Estado brasileiro. Manterá o presidencialismo de coalizão brasileiro, em que o presidente da República apenas consegue maioria no parlamento, loteando milhares de cargos nos ministério e nas estatais, entre os muitos partidos do chamado "Centrão". Manterá os privilégios de classe. Não será fácil, até porque Bolsonaro vem em dose quádrupla: ele tem 4 filhos como ele. Na área internacional, o que se desespera é a retaliação de boa parte do mundo pelo discurso e meditas de Bolsonaro, como já está acontecendo. E podem ir se acostumando com a retórica indecorosa e absurda de Bolsonaro, o que não vão faltar são as mais absurdas declarações já realizadas um presidente da República no Brasil.
Mas, tudo será um mal necessário. O ideário fascista que instrui o bolsonarismo já vem circulando livremente em nossa sociedade há muito tempo. Liga-se a televisão ou o radio e se escuta a todo o momento que “direitos humanos são direito de bandido”, que “bandido bom é bandido morto”, que “menoridade é sinônimo de impunidade”, etc. etc. O racismo e o materialismo circulam muito nos enredos das novelas e as pessoas sempre agindo de forma velada na mais hipócrita das sociedades. Agora não. Agora o fascismo se formalizou, se revelou, se instituiu, não é mais velado. Muitos foram os fascistas que se revelaram em nosso convívio. E é muito mais fácil combater aquilo que se vê do que aquilo que vive escondido. Pela primeira vez, em muito tempo, o Brasil terá a oportunidade de ficar face a face com tudo aquilo que ele precisa combater.

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